Luis Ferreira

Luis Ferreira

Nefrologistas precisam-se

O bem mais precioso que podemos ter é a saúde. E quando ela começa a escassear, só nos resta recorrer aos serviços que a podem oferecer. Para isso, é necessário ter um bom serviço nacional de saúde.

Deixou-nos, ainda não há muito tempo, aquele que foi o mentor e implementador do Serviço Nacional de Saúde. Homem de visão e sagacidade que apostou no colmatar de uma falha existente para bem de todo o povo português. Dar saúde a todos por direito, num Estado de Direito. Uma das maiores conquistas de abril.

A sua implementação levou algum tempo, mas foi crucial para a saúde portuguesa. Altos e baixos, como em tudo o que se quer fazer bem, esteve sempre dependente dos dinheiros públicos, levando a ajustes dos vários orçamentos de Estado. Nos últimos tempos, a justeza dos orçamentos, levou os governos a retirar alguns serviços e a diminuir outros, alterando o que se pretendia com o bom funcionamento.

Lembramo-nos certamente que ao longo de todas estas décadas em que contámos com o Serviço Nacional de Saúde, nem sempre houve bom entendimento entre a administração e os médicos, o que levou à criação de serviços de periferia, que muito aborreceu corpo clínico que se viu afastado dos principais centros urbanos, como se as pessoas do interior não tivessem direito a ser assistidos ou os hospitais dispensassem algumas valências, descurando os seus utentes e a sua saúde. Foram tempos de exigência e em que se pensou mais neste interior votado ao abandono. Contudo, ficou a necessidade de não se descurarem os doentes crónicos, que a expensas do Estado, são atendidos mais ou menos bem, mas de acordo com premissas previamente estipuladas, tendo sempre ou quase em atenção a vertente económica do sistema.

É o que se passa com algumas valências, onde existem os doentes e muitos, mas não há médicos especialistas para todos eles, remetendo para o setor de enfermagem os cuidados a ter com eles. É o caso dos doentes sujeitos a hemodiálise, que deveriam ter sempre obrigatoriamente por lei, um médico nefrologistas diário, mas não têm.

O hospital de Bragança teve até há um ano atrás uma médica nefrologista que atendia os cerca de 80 doentes a fazer diálise. A médica saiu para um hospital do Porto e embora dissessem que seria substituída, o certo é que não foi. O serviço de hemodiálise do hospital de Bragança está sem médico nefrologista residente, valendo-lhe um médico da especialidade que vem uma vez por semana de Mirandela, onde tem uma clínica particular. Como é possível que isto aconteça?

A explicação dá-las-á quem souber ou quiser. Não sei se foram abertos concursos e ficaram desertos ou se nem sequer foram abertos para economizar dinheiros públicos. Mas uma coisa é certa: os doentes não podem estar todos os dias a fazer diálise e não ter um médico especialista que possa obviar a algum contratempo que possa surgir a um doente qualquer. A lei obriga a que o hospital tenha um especialista no serviço. Não pode ser ao sabor de quem manda, de quem quer ou não, ou mesmo do que interessa aos serviços. E se a vaga não é preenchida em concurso, então que se arranjem estratagemas que obriguem um médico nefrologista a ocupar o lugar. Se a lei existe e obriga, então que se cumpra.

O corpo de enfermagem tem assegurado esse serviço dentro das limitações a que se vê obrigado, mas não pode substituir o clínico. Neste trabalho insano, há que louvar esses profissionais, mas muito fica por fazer e cumprir. Como diz o povo, não se fazem morcelas sem sangue. Assim, correm-se riscos desnecessários e perigosos. Felizmente que no serviço de Diálise há médicos que por lá vão passando, pois que é necessário observar outros parâmetros dos doentes, mas não são nefrologistas e ninguém pode querer tapar o Sol com a peneira!

Quando o Serviço Nacional de Saúde foi criado não esperava certamente que estas situações se viessem a verificar. Infelizmente. De há uns anos para cá, a saúde tem andado aos trambolhões e só se pensa em como arranjar dinheiro ou em poupá-lo à custa dos doentes que estão à espera de ser bem atendidos. A crise de 2008 veio agravar toda a situação e como os dinheiros públicos eram escassos, os governos logo equacionaram um meio de os utentes terem de pagar e bem, para usufruir dos serviços. O problema agrava-se quando os serviços não são prestados porque não existe corpo clínico adequado. Culpamos os dirigentes, culpamos o Estado, mas não nos culpamos a nós porquê? Alguém tem de alertar para esta situação antes que seja tarde.

É pois urgente que no hospital de Bragança se faça cumprir a lei e que seja preenchida a vaga de nefrologia antes que seja demasiado tarde. Os riscos que os doentes em diálise correm são imensos e podem surgir quando menos de espera. Queira Deus que não se chegue a tanto!


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