Para avaliar a possibilidade de vir a instalar um parque eólico destinado à produção de energia eléctrica na serra do Leiranco, em Sapiãos, no passado mês de Junho, a junta desta freguesia, presidida pelo social-democrata António Barros, e a Câmara Municipal de Boticas assinaram um contrato/promessa em que a junta cede à Câmara a exploração dos terrenos baldios necessários para a implantação do projecto. Uma vez que, conforme determina a Lei, a administração dos baldios não pertence à Junta, mas aos compartes, ou seja, todos os habitantes da freguesia inscritos nos cadernos eleitorais, António Barros alegou no contrato que a administração desses terrenos foi delgada na Junta de Freguesia numa assembleia de compartes, realizada a 28 de Janeiro de 1996, da qual diz possuir uma acta. Na altura a junta era presidida por José Torres, também eleito pelo PSD.

Acta \"fabricada\"

Acontece, porém, que alguns habitantes de Sapiãos asseguram que tal reunião nunca se realizou e que se existe uma acta, ela foi \"fabricada\" pelos dirigentes da junta.

António Exposto, um outro ex-presidente da Junta e ex-presidente do Conselho Directivo dos Baldios de Sapiãos jura a pés juntos que a última assembleia de Compartes que teve lugar naquela freguesia foi em 1989. \"A partir daí, o conselho directivo desfez-se e nunca mais houve nada\", garante.

Outro habitante de Sapiãos contactado pelo Semanário TRANSMONTANO, que preferiu manter o anonimato, assegura também não ter tido conhecimento da dita assembleia, cuja convocatória deve ser obrigatoriamente publicada em editais afixados nos lugares do costume. \"Se alguma reunião houve, foi feita de forma secreta. Ninguém foi sabedor\", diz o mesmo morador

\"Só quem não for honesto e verdadeiro é que poder dizer que a reunião se realizou\", disse ainda um outro habitante que também não quis ser identificado.

\"Tudo legal\"

Apesar de se recusar a mostrar a acta da assembleia de compartes à imprensa, o presidente da Junta de Freguesia de Sapiãos garante que a exibirá a qualquer habitante que lha solicite na sede da Junta. \"Não tenho nada a esconder, não fazemos nada que não esteja dentro da Lei\", afiança António Barros, para acrescentar, de forma irónica: \"As pessoas que falam não têm nada a ver com Sapiãos. Se calhar naquela altura [em que se realizou a assembleia] estavam na Lua\".

O autarca diz ainda que, embora a assembleia de compartes de 1996 já lhe tenha conferido legitimidade para a cedência dos terrenos à Câmara, \"se fosse preciso, amanhã mesmo juntava 90 por cento da população para me serem concedidas novas delegações sobre a administração dos baldios\".

Armando Carvalho, da Comissão Nacional da Agricultura e especialista nesta matéria, explica, no entanto, que a delegação de poderes sobre os baldios nas juntas de freguesia é apenas do fórum executivo. O que quer dizer que as deliberações terão sempre de ser tomadas pelos compartes. Por isso, o dirigente associativo diz que a definição dos valores a pagar pelos terrenos e a escolha da empresa que irá explorar o parque eólico, por exemplo, deveriam ser decididos pelo povo. O que não aconteceu.

Armando Carvalho lembra ainda que as delegações de competências podem ser revogadas a qualquer altura, desde que 5 por cento dos compartes convoquem, com oito dias de antecedência, uma assembleia para esse efeito.

Os números do contrato

Pela cedência da exploração, a Câmara Municipal de Boticas compromete-se a pagar à Junta de Sapiãos uma renda de cinco mil euros, por um período inicial de três anos. Ou seja, o espaço de tempo que se julga necessário para a fase de estudos de viabilidade do parque eólico, o seu licenciamento e a sua posterior instalação.

Além disso, assim que o primeiro aerogerador começar a produzir energia, a Câmara pagará anualmente à Junta a maior destas importâncias, 1.500 euros por torre instalada ou 2.000 euros por Megawatt instalado. Por sua vez, a Câmara cederá os terrenos à Enernova, empresa do grupo EDP, que instalará o parque.



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