Ana Soares
A Democracia é bela! Só os que não pensam como eu dão cabo dela…
Donald Trump foi eleito 45.º Presidente dos Estados Unidos da América. Numa manhã de esmagadora surpresa – tal como foi a vitória do Brexit há uns tempos atrás – os ecos das eleições não demoraram a fazer-se ouvir. E que ecos meus Senhores!
Importa deixar claro que não me revejo na postura nem no discurso (na maioria) de Donald Trump. Mas também não vejo em Hillary Clinton a salvadora da boa imagem e política de princípios que nos tentaram vender ao longo do último ano. É, sem dúvida uma mulher trabalhadora e excelente académica que nunca ocultou as suas ambições e se posicionou sempre para as cumprir, mas – talvez até pela excessiva preparação – se tornou uma mulher construída, nada espontânea e perita nos corredores do poder. E nos lobbies, claro. Da minha parte, se não me revejo em Donald Trump tampouco me revejo numa Mulher que tem posições que atentam contra aqueles que são, para mim, valores fundamentais como é a sua posição radical de defesa extrema do aborto a todo o tempo. Aliás, uma das questões mais interessantes sobre estas eleições é tentar perceber como é que a eleição se resumiu a dois candidatos com estes perfis. Se fosse eleitora desta eleição presidencial, com total sinceridade, não saberia em quem votar.
Por outro lado, muito do que leio nas redes sociais faz-me concluir o peso crescente que « têm os media. As posições são tão coladas ao que é veiculado pela comunicação social que era capaz de apostar que uma enorme percentagem das pessoas que hoje opin,a de uma tribuna de sapiência superior ao voto dos americanos, nunca viu um debate completo dos candidatos, nunca pesquisou sobre as suas posições políticas ou leu textos escritos por eles. E quando se opina com base em opiniões, abdicamos do bastião definidor do ser-humano: a capacidade de pensar. E, isto sim, para mim é um sinal preocupante para o futuro.
Confesso que esta moda de “A Democracia é bela, só os que não pensam como eu dão cabo dela” é algo que me transcende e – porque não admiti-lo – me tira do sério. Obviamente todos podemos concordar mais, ou menos, com os resultados de determinadas eleições, mas daí a colocarmo-nos num patamar superior, de “vergonha” ou “pudor” face àquelas que são as decisões de quem realmente decide, os eleitores, é algo que não se coaduna com a minha ideia de democracia.
Para dar apenas um exemplo, repare-se que, há algumas semanas, estava em cima da mesa a possibilidade do “magnata anti-establighment” (como está rotulado, mas que não creio que o seja) não aceitar a derrota e não fazer o habitual discurso de perdedor, caso fosse o caso. Hoje, pouco se falou do facto da Candidata Clinton ter demorado quase um dia a admitir a derrota – em todas as frentes – e, menos ainda, foram feitas as leituras que já haviam sido projectadas para Trump. Dois pesos e duas medidas…
Se as eleições de 8 de Novembro têm consequências para todo o mundo, certo é também que os Estado-Unidenses estão num momento de estagnação. A este título, vejam-se os estudos que revelam um número impressionante de pessoas que hoje ganha o mesmo – ou menos – do que ganhava em 1999. A este facto acresce uma descrença generalizada nos corredores da política e no modo actual de fazer política, o que se está a fazer sentir nos resultados eleitorais de vários países (e, diria eu, que não se traduz em mais países por incapacidade de lideres políticos capitalizarem este facto como fez Trump, o Podemos ou Le Pen). E não é uma questão ideológica. É social. E depois há também a questão do medo que atormenta o dia-a-dia de quem quer viver uma vida pacífica…
Certo é que o mandato de Trump é, para todos, uma incerteza. Creio que até para ele próprio. Entre posições extremistas, ideias voláteis e um discurso de vencedor que segue a tradição unificadora, pouco se consegue adivinhar sobre como será dirigida a Casa Branca. De qualquer modo, tal como o Brexit, não creio que esta eleição seja o início do Apocalipse.