Manuel Igreja
A Demografia e o Centralismo
Winston Churchill, um dos grandes estadistas do século passado e prémio Nobel da Literatura, resumia com extrema mestria ideias muito completas, complexas e valiosas. Numa penada, três ou quatro linhas meramente, expressava todo um universo de conceitos.
Numa certa vez ditou o senhor que a democracia é o pior de todos os regimes políticos com excepção de todos os outros. Sem mais. Num ápice, lemos, pensamos e concordamos. Isto claro desde que dentro de nós esteja sentimento de amor a essa fina flor que é a democracia, e atitudes que a robusteçam em cada atitude perante os outros.
No entanto a espécie é frágil. Muito frágil. Custa a entranhar-se e frequentemente desilude. Promete muito e muito se espera dela, por isso fácil é o desencanto. Depois, contém nela própria muitas condições que permitem o surgir de medidas que lhe são contrárias e que a renegam apesar de frequentes e veemente juras de amor. Facilmente é traída e desprezada que nem uma megera.
Como aprendemos mesmo que nem sempre pratiquemos, a essência da democracia reside no tão importante e sublime facto de cada cidadão valer um voto. Uma arma expressiva de vontades individuais que depois de somadas logo viram vontades colectivas. Com ela delegamos poderes para o mando dos assuntos da nossa comunidade.
Em parte, e utilizando modos de expressar dos antigos, aí é que a porca torce o rabo provocando danos. Neste tempo de todas as modernidades em que tudo é efémero e extremamente rápido tudo se sabe e tudo se mede quase ao instante. Os que estão de boca aberta à espera que lhes caia no bico cada voto, sabem o que fazer para cativar cada expressão de vontade no boletim respectivo.
Obviamente que também sabem onde eles estão em número, assim como sabem que a qualidade é repetida e igual em toda a parte. Por isso entoam cantos de sereia ao jeito dos ouvidos a atingir e tomam medidas com a forma dos interesses medidos e pesados a régua e esquadro.
Sem rumo de médio ou longo prazo que conte, sem carisma, e visando a mera conquista ou a manutenção do poder, quem o ocupa rege-se pela batuta dos anseios imediatos dos que votam. Os que visam o alcance do ceptro, prometem, juram e criticam. Tudo isto num mundo sem convicções, mas com muito espalhar de ilusões.
O chão em que a democracia germina está infestado. O território da nação está desuniforme e despovoado no interior, para estar crescentemente sobrelotado no litoral. Vive-se por lá que nem sardinha em barricas, mas mesmo assim o êxodo continua.
Neste ponto, a demografia prejudica. Os estudos apontam para que no ano de 2040, oitenta por cento da população de Portugal resida no litoral num global igual ao do ano de 1960. Regredimos. Os vinte por cento que restam, estarão em grande parte nas cidades de média dimensão. No resto não faltarão fantasmas.
Posto isto, nada custa perceber porque nos abandonam e porque é que cada polo urbano mais significativo tende a puxar para si e consegue, os instrumentos e os equipamentos que optimizam a vida de cada um e por consequência de todos. O poder é exercido em círculos centrípetos de maior ou menor dimensão espalhados pelo país.
Juram-nos o contrário, claro. Mas como se costuma dizer, uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa.