Alexandre Parafita
À descoberta da linguística africana
O território das ex-colónias portuguesas em África continua esquecido da maioria dos linguistas, não obstante o trabalho dos missionários desenvolvido ao longo dos séculos na sua relação com as línguas nativas. O mesmo acontece, de resto, com a generalidade das línguas autóctones do continente africano, sabendo-se, de acordo com dados públicos, que existem mais de 2.000 línguas, agrupadas em quatro grandes famílias linguísticas: Niger-Congo (1.539 línguas), Afro-asiático (376 línguas), Nilo-Sahariana (207 línguas) e Khoisan (36 línguas).
O Centro de Estudos em Letras (CEL) da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), que vem desenvolvendo trabalhos de grande qualidade nos domínios das ciências da linguagem e, em particular, da historiografia linguística e da linguística missionária, encontrou nestas lacunas motivação bastante para a realização de estudos pertinentes com o foco no desenvolvimento do estudo das descrições linguísticas de Angola e Moçambique. Para tal, leva em conta o trabalho metalinguístico dos missionários do Padroado Português sobre as línguas “nacionais” faladas nas ex-colónias portuguesas, um trabalho que é praticamente desconhecido em Portugal e inclusive nos próprios países a que respeitam. Aliás, são muito escassos os trabalhos de investigação conhecidos sobre a lexicografia e gramaticografia das línguas nativas dos países lusófonos, com uma honrosa exceção do Brasil.
É, por isso, urgente reverter a situação e a intervenção do CEL começará pela contratação de um investigador doutorado, por 36 meses, para estudar as fontes primárias metalinguísticas (gramaticais e lexicográficas) das línguas nacionais africanas, escritas por missionários do Padroado Português e leigos (em língua portuguesa), entre 1482 e 1975. Reconhece-se também o grande interesse que a linguística missionária tem vindo a merecer, nas duas últimas décadas, como área de investigação no âmbito da historiografia linguística, com a realização de colóquios e congressos internacionais, em que investigadores do CEL têm participado ativamente desde 2004.
O Centro de Estudos em Letras da UTAD, que recentemente passou a integrar o Comité International Permanent des Linguistes (CIPL), sendo o único centro de investigação português daquela organização, tem agora uma redobrada responsabilidade numa área especialmente protegida pela UNESCO, como é a da preservação das línguas minoritárias e em risco, e procura reforçar também a sua projeção internacional.