Manuel Igreja

Manuel Igreja

A História, a Memória e os Erros

Dizia um certo senhor há coisa de século e meio, que a História se repete, primeiro como tragédia e depois como comédia. Não seria mau de todo se assim fosse sempre, pois pelo menos numa das vezes, daria para rir.

Eventualmente ao longo dos tempos, assim sucedeu. Seja como for, se atentarmos nesta época tresloucada, mais uma só que com mais terríveis efeitos a acontecer ou a vir a suceder, poderemos facilmente concluir que ela, a História inequivocamente se está a repetir.

Quando se não está ainda a desenrolar em cópia, começam a desenhar-se os contornos, que poderão vir a completar o similar acontecer. Por exemplo, na Alemanha, a extrema-direita cavalga a toda a brida para o prado do Poder, aproveitando a essência da Democracia que esconjura.

Outro exemplo. Numa recente sondagem feita com pessoas com idade entre os dezoito e os sessenta anos nos Estados Unidos da América, concluiu-se que a maioria tanto lhe faz viver ou não num regime democrático, desde que sinta garantido o seu prato de lentilhas em cima da mesa e umas notas na carteira para derreter.

Podia pedir-lhes para olharem comigo para a própria Europa além da Alemanha a que aludi e facilmente vislumbraríamos fenómenos iguais em que os cavaleiros negros travestidos com corres claras que enganam, nos juram promessas de amor e de melhor viver.

O futuro que deixou de ser o que era, o medo, o desconforto que se não nota, mas se sente, os desejos pelo que se não tem nem virá a ter, e outras coisas que tais, explicam em boa medida o fenómeno. Não é nova a situação, pois por exemplo há quase cem anos levou-nos à tragédia insana da Segunda Grande Guerra.

No dealbar do século XXI, quase juraríamos que havíamos aprendido a lição e que a verborreia mental que levou milhões de pessoas a acreditar e a seguir os loucos que atiraram o trem comum para o precipício jamais em tempo algum, outra vez aconteceria porque a Democracia sempre iria florir nos nossos corações.

É o pior de todos os regimes com exceção de todos os outros, como disse um outro certo senhor, por isso é e será sempre o nosso regime, nem que seja contraventos e marés. Pensávamos nós nos países onde ela estava dada como garantida, pois tínhamos conhecimento e memória sobre o que acontece quando ela não vigora ou nunca vigorou.

Quanto a mim, o ponto de agora é precisamente esse. Os cidadãos que sofreram na pele e nos corações a barbárie são em número muito reduzido levados que foram pela lei da vida que nos leva à morte. Outros, os que têm cabelos brancos, sabem dos ecos que lhes chegaram. Ainda viram o rabo da besta ao virar da esquina nas ruas da amargura.

Mas os outros, senhores, a maioria, não sabe. Não tem memória e nunca aprendeu, apesar de poder ter aprendido. Andou e anda ocupada com lantejoulas e com as luzes da ribalta que nunca alcançam porque elas lhes fogem, destinadas que são a uns poucos.

Por isso, basta um pequeno chispar no rastilho do medo acoitado neste mundo sem norte, sem timoneiros sérios e à séria, sem ética porque grassa a selva, sem moral porque campeia o egoísmo, e logo despontam as urtigas que fazem as pessoas mandar a democracia para as malvas.

Não se cultivou a memória e não se ensinou nem valorizou a História. Só disseram que temos de ser predadores para não sermos presas. Com pessimismo que baste, mas com a esperança devida, estarão reunidas as condições ideais para a História se repetir apesar de todos os erros cometidos e exibidos. Digo eu que ouvi dizer que atrás dos tempos vêm tempos, e outros tempos hão-de vir.



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