Manuel Igreja

Manuel Igreja

A Oeste nada de novo

                                        A OESTE NADA DE NOVO

A Oeste Nada de Novo, é o título de um livro, um romance, onde um soldado alemão, descreve a maneira alegremente insana com que os seus concidadãos festejaram a ida para a guerra dos seus imberbes rapazes, e onde dá conta da quase completa alienação com que foram acompanhando o terrível e trágico desenrolar das batalhas.

É a visão de um soldado do lado dos que iriam ser vencidos, que de igual forma se comportaram no imediatamente antes e no decurso da guerra, a maior de todas até aí, relativamente aos vencedores que também impantes e quase tresloucados enviaram os seus jovens para o inferno na terra.

Nos primeiros meses de uma guerra alargada que se iniciando em agosto supostamente estaria terminada antes do Natal, festejou-se a vã glória de colocar moços que se não conheciam nem odiavam a matarem-se entre si em nome de homens feitos que se conheciam e se odiavam. Durou quatro longos e terríveis anos, e modificou e influenciou todos os equilíbrios a partir do seu fim em 1918.

Mas como disse antes, festejou-se. Agora, seguindo-me, venha daí, pois não é da Grande Guerra que quero falar-lhes. A caneta está a tender para isso, mas vou contrariá-la pois quem manda sou. Meia-volta e marcha! Vamos dar um salto no tempo até aos dias que nos couberam em sorte para vivermos.

Chegados, vou fazer um rápido paralelismo. Andava a guerra pelo seu fim com a derrota da Alemanha mais que certa, e diz o soldado regressado à sua aldeia para curar os ferimentos da alma e do físico que via os seus concidadãos a leste de tudo e confiantes na vitória final. Por mais que se lhes desse o alerta não ligavam. Preferiam a verdade mais conveniente à verdade nua e crua das coisas de cada qual e por isso de todos.

Agora quedem-se um pouco e notem se fazem o obséquio, se a realidade destes nossos dias se não se lhe assemelha. Bem sei que felizmente para nós em Portugal e nos países que lhe são proximamente imediatos não caiem bombas e não se vê a morte em cada esquina, mas pode-se chegar ao local da guerra indo-se a pé. Cada estilhaçar de bomba mina as nossas estruturas.

No entanto temos a guerra como dos outros e a muitas léguas. Esquecemo-nos que o mundo está feito uma pequena aldeia graças às tecnologias que inventámos para nosso bem e para nosso mal se não tivemos cuidado. Mercê delas, conseguimos coisas nunca vistas, inclusivamente a rapidez com que o tempo se move. Os segundos têm a mesma duração, a cronologia continua igual, mas tudo acontece quase sem dar tempo ao tempo de se arranjar para se apresentar.

Entregue a meia dúzia de flibusteiros e bandoleiros engravatados, este nosso mundo segue o rumo por eles destinado como nau carregada de especiarias a caminho do porto de interesse dos piratas salteadores e vencedores. O passado continua a ser incerto porque não se pode reescrever, o presente é cada vez mais fugaz, e o futuro está crescentemente mais incerto porque deixou de ser o que era.

O mundo transforma-se a cada dia, comunica-se, mas não se informa, avança, diz quem sabe em direção ao precipício porque estamos a dar cabo dele, as máquinas já pensam e só lhes falta sentir, as ameaças ao nosso modo de vida são permanentes. Umas existem desde há muito, outras nascem a cada instante e outras, muitas, estão à espera de vez para se evidenciarem após serem inventadas.

No entretanto, os aglutinadores e difusores de opiniões e de convicções que outrora defendiam causas apresentadas como redentoras, dedicam-se agora a floreados e a questionar com os olhos de agora acontecimentos de há séculos, e os detentores do poder foram vendendo convicções e foram deixando que tudo fluísse segundo os interesses de quem detém montanhas de dinheiro.

A insegurança tomou conta das nossas vidas e ninguém se importou. Finos e porque as palavras são fáceis de formar, alguns aproveitaram e aproveitam o vazio e o sentimento de desconsideração e de desatenção dos cidadãos. Acusam, e qual curandeiros dizem-se detentores da poção mágica.

São já milhões os que neles acreditam. Os outros, igualmente aos milhões, pouco ligam e como os concidadãos do soldado alemão da Primeira Grande Guerra, vão bailando e encolhendo os ombros. Nas cartas que enviam ou nos diários que escrevem mentalmente para si mesmos, escrevem que “a oeste nada de novo”.



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