Alexandre Parafita

Alexandre Parafita

A Serrada da Velha

Acontece na noite de 4ª feira a meio da Quaresma. Tem origem nos antigos ritos de passagem que simbolizavam a expulsão do inverno. A “velha” não é mais do que uma figura simbólica, uma entidade mítica, conotada com as agruras, a fome e a miséria do inverno. A serração é, pois, o resquício de um culto pagão que significa o esconjuro das trevas invernais, da esterilidade dos campos, almejando o rumo da luz esperançosa da primavera, o tempo da fecundação e procriação.

Os rituais variam consoante a dinâmica interpretativa da cosmogonia das comunidades. Em algumas, expõe-se num carro de bois um boneco de palha que é serrado e/ou queimado pelos rapazes com recitações versejadas de crítica social. Noutras, as mais comuns em Trás-os-Montes, são visadas as mulheres que no último ano hajam sido avós. Os rapazes, munidos de um embude, e serrando ruidosamente um toro oco de madeira, recitam as “toradas” à porta das visadas por vezes com severas críticas (“Ó tia Joana Micas / Vimos cá serrar-lhe as pernas / A ver se deixa de andar / Sempre a correr prás tabernas”).

Esta tradição foi levada para o Brasil no Séc. XVIII, contudo os excessos cometidos chegaram a tal ponto, que teve de ser aplicada uma postura legal proibindo os chamados “cerramentos de velhos” com uma multa de cinco mil réis aos infratores.

[É bom também saber que, hoje em dia, por cá muitas avós, algumas com 40 e poucos anos de idade, são ainda autênticas “raparigas”, mais ágeis do que muitos dos mafarricos que as vão serrar. Por isso, não raramente fazem desabar sobre eles um caneco de água fria, quando não a lavagem dos porcos… ou coisa pior.]


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