Teresa A. Ferreira

Teresa A. Ferreira

Amor eterno

- Vamos para a mesa que o jantar está servido. – informava a Sara, mãe do Gonçalo e do Mateus.

Os rapazes estavam a jogar uns videojogos, mas levantaram-se de pronto – a fome era mais do que muita.

Nessa noite também se juntou à família a tia Benedita, e os moços adoravam a tia. Tinha sempre umas boas histórias para contar, coisas de arregalar o olho.

A Sara estava divorciada do pai dos filhos e decidiu não voltar a casar; enquanto a Benedita era solteira por opção, embora não lhe faltassem pretendentes.

- O que é o jantar, mãe? Cheira tão bem! – perguntava o Gonçalo.

- Cabrito assado no forno com batatinhas novas.

- Estou a ver que hoje há comemoração. Vamos então ver desse cabrito. – dizia o Mateus.

Cada um foi-se servindo e quando estavam a meio do jantar a tia Benedita resolveu lembrar qual era a data especial que se comemorava – o aniversário da sua bisavó Rosalina - e acrescentou que tinha uma história de família para contar.

Os moços adoravam a tia e as suas histórias, sendo que esta era daquelas bem verdadeiras.

- Já alguém vos falou do bisavô Artur?

- Não, tia. Nunca ouvimos tal nome. – respondiam os rapazes em uníssono.

- Então vão ficar a conhecer uma bela história de amor, passada na nossa família.

- Conta, mana. Essa história não se pode perder. – dizia a Sara com um sorriso luminoso.

- O bisavô Artur era o herdeiro de um grande morgadio, aqui por estas bandas, numa aldeia bem próxima da cidade. Vivia com os pais e os irmãos, numa casa brasonada, com vários criados e criadas de servir. Essa casa e várias terras haviam sido compradas pelo seu bisavô a um fidalgo que falira. Viviam muito bem e eram proprietários de várias casas e terrenos, tanto na aldeia como na cidade.

Certo dia, apareceu-lhes à porta uma jovem pedindo emprego de criada. O seu nome era Rosalina - uma beleza de moça, embora analfabeta como a maioria na época. Foi aceite para criada das senhoras da casa.

A Rosalina espalhava brilho por onde passava e deitava a mão. Tudo fazia com a máxima perfeição.

O Artur, era o único rapaz que não fora estudar para Coimbra. Os seus três irmãos eram formados: um em juiz, outro engenheiro agrícola e o terceiro em farmacêutico. As raparigas ficaram apenas pela instrução primária, tal como o Artur. Ele não quis estudar porque gostava das lides do campo.

Com o passar dos dias, o Artur encantou-se pela Rosalina. E para mote de proximidade, disse-lhe que a ensinava a ler e a escrever, sem ninguém suspeitar.

Ora bem! A Rosalina foi uma excelente aluna e o Artur, depois de lhe pedir permissão para a namorar, foi dizer ao pai que queria noivar e casar com ela.

Armou-se um escândalo, isso é que foi!

O pai tinha combinado casá-lo com uma prima, rica e cheia de prendas, agora o diacho do rapaz foi bater o pé que queria casar com a criada. Onde já se viu tamanha afronta?

Como o Artur estava resoluto e ninguém o demovia, o pai retirou-lhe o morgadio e deu-o ao filho mais novo, o Miguel, que já era juiz. Para não desamparar completamente o filho mais velho, deu-lhe uma casa e uns terrenos e que se amanhasse mais a criada.

Os noivos casaram, para desgosto da família que não compareceu ao casamento e foram viver para a casa que o pai do Artur lhe deu.

De presente de casamento, Artur mandou gravar monogramas com o nome da futura esposa em todo o enxoval e até nos móveis.

A vida foi-lhes sorrindo, uma vez que o Artur sabia orientar-se bem com os negócios da agricultura. A Rosalina passou a ter criadas em casa para a ajudarem. Foram nascendo os filhos e cada vez mais a vida prosperava.

Certo dia, o Artur, foi de cavalo à cidade fazer uns negócios na feira. Na volta, apareceu uma cobra que mordeu a pata do cavalo. Este, com o susto, ergue-se num de repente e fez cair Artur ao chão que bateu com a cabeça numa pedra e faleceu.

A Rosalina não se atrapalhou. Como sabia ler e escrever e era muito inteligente, tratou da casa e dos negócios da agricultura com a ajuda dos filhos e dos criados. Nunca lhes faltou nada em casa nem nas tulhas e a vida até prosperou.

Longa vida teve a bisavó Rosalina. Num serão, a dias de fazer cem anos, faleceu sentada no escano, junto à lareira, a fazer renda, rodeada pelos filhos e netos que julgavam ter adormecido.

- Oh, tia! A tua bisavó não voltou a casar?

- Não, não quis.

- Foi fiel ao marido até morrer. – afirmava a Sara.

- Que história tão linda! – exclamavam os jovens.

- O que é a sobremesa, mãe?

- Farófias que a tia trouxe, feitas conforme a receita que a bisavó Rosalina deixou à família.

- Hoje é mesmo dia de comemorar. – com um largo sorriso, o Mateus ergueu o copo e todos o acompanharam.


© Teresa do Amparo Ferreira, 21-03-2025

Nota: este conto está ficcionado, embora baseado em factos da vida real.



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