Henrique Ferreira

Henrique Ferreira

Bolsonaro e a metamorfose violenta da Esquerda

Na sua 11ª Tese sobre Feuerbach, Marx escreveu (cito de cor): «Até agora, os homens não fizeram mais do que interpretar o mundo mas o que é preciso é transformá-lo».

Karl Marx fez do resto da sua vida uma luta para transformar o mundo mas o seu resultado e o dos que quiseram aplicar as suas receitas foi catastrófico: purgas, campos de concentração, extermínios, subdesenvolvimento e pobreza.

Para construir a sua teoria da acção revolucionária, Marx cometeu um dos maiores erros filosóficos de sempre que foi abolir o segundo momento da dialéctica hegeleana: havia pobres e ricos? Os ricos oprimem os pobres? Pois ao contrário do que teorizou Hegel, não vamos tolerar a oposição e diálogo entre pobres e ricos, vamos suprimir os ricos. Como? Matando-os, se necessário.

A partir dos anos 50 do Século XX, os neomarxistas, desiludidos com os fracos resultados do marxismo em acção, começaram a teorizar que o falhanço das políticas socialistas se deveu ao boicote dos capitalistas. O Movimento da Nova Esquerda, nos EUA , nos anos 60, mais não é do que a tentativa de recuperar o marxismo dando-lhe suporte intelectual mas a acção já não era revolucionária mas sim de transformação da sociedade burguesa, minando-a nos seus alicerces.

O intelectual de esquerda era visto como o messias da política de libertação dos povos mas, quando confrontado com as dificuldades da realidade em si mesma, baqueava, divagava, tropeçava e deixava que o desastre se instalasse. Muitas das ideias como luta contra as desigualdades, solidariedade e libertação até venceram mas, no geral, a Nova Esquerda legitimou, ainda mais que o marxismo, as estruturas capitalistas.

E eis que chegámos ao Brasil com esses intelectuais de esquerda, esses «aluciandos do outro mundo», na expressão de Georges Gusdorf, a governarem como autênticos esquerdistas do caviar e a servirem-se do Estado como se este fosse uma empresa capitalista ao serviço do patrão. O resultado? uma reacção colectiva, não revolucionária e acéfala mas com uma ideia clara: de momento, só interessa derrubar a Esquerda. O resto se verá depois.

Graças a Paulo Freire e seus seguidores, os brasileiros concluíram que entre o discurso da esquerda e a sua acção, na prática, vai uma diferença tão grande como aquela que existiu entre a teoria da alienação do trabalhador pelo capitalista e as teses para a sua libertação. Neste sentido, há um enorme contributo destas eleições: o fim da esquerda corrupta, utópica e irreal.

O mundo não será o mesmo depois destas eleições no Brasil. A Esquerda, ou se transforma ou morre definitivamente. As suas crises, em 1930, em 1970 e em 1989, foram apenas episódios traumáticos. Agora, ou os homens de esquerda são mesmo homens do trabalho, da acção e da justiça social, com as competências necessárias, ou a Esquerda sofrerá um eclipse quase total. Para mal dos de Direita e de todos, segundo as leis da dialéctica.


Partilhar:

+ Crónicas