Henrique Ferreira
Bom falecimento?
A eutanásia está em discussão na Assembleia da República e, em princípio, a proposta de despenalização e descriminalização da sua prática será votada na próxima terça-feira, dia 29 de Maio de 2018.Não sei se sim, se não à eutanásia.
Sei é que o Parlamento, qual Rei absoluto, vai deliberar. Se deliberar sim à despenalização, está no uso dos seus poderes legais mas não no uso de legítimos poderes sociais e morais. Fará uma usurpação de uma decisão que pertence a um outro soberano, o Povo, em Referendo. Mas como muito bem escreveram Paulo Otero, João Santos, Henrique Ferreira e Maurice Bellamy, vivemos numa «Democracia Totalitária» (Paulo Otero), no mínimo, «Autoritária» (João Santos e Henrique Ferreira), num totalitarismo tranquilo (Maurice Bellamy).
Nesta democracia no mínimo autorotária, com quase todas as características do Estado Administrativo do Salazarismo, pratica-se constantemente a usurpação de poderes. E este caso da eutanásia é um bom exemplo.
Não sei como é que hei-de traduzir esta palavra «eutanásia» cujo significado divulgado tem sido o de proporcionar uma morte feliz ou uma morte em paz.
Em bom rigor, na sua origem etimológica grega, eutanásia é composta de três elementos: o prefixo eu (bem, bom, boa), a palavra thanatos (morte) e o sufixo ia (acção ou movimento para, neste caso, para morrer.
Portanto, a eutanásia é um processo de facilitação da morte. Mesmo que esta aconteça na sequência de um acto voluntário por parte do morrente (o que quer morrer), há sempre um facilitador ( o que dá o conprimido ou a injecção e os analgésicos)
Portanto, não sei se a eutanásia será uma eutanásia, uma tanásia, um suicídio, um assassínio ou uma cacotanásia (neste caso, também do Grego, má, feia morte).
Sei é que, por mais inevitável que venha a ser a despenalização da tanásia porque não vai haver capacidade para pagar tantos cuidados paliativos face ao envelhecimento e ao viver para lá do que é normal, e porque o amor ao próximo e ao outro já despareceram enquanto paradigmas da nossa civilização, a «barbárie doce» nas palavras de Jacques le Goff, está aí destruindo todos os ideais de fraternidade, de respeito mútuo, de reciprocidade, de amor e de respeito por nós próprios.
O Parlamento discutir a eutanásia sem dar a decisão ao Povo é pois uma barbárie democrática, uma acto de usurpação ao Povo, uma irresponsabilidade civilizacional.
Bragança, 24 de Maio de 2018