Chorai, netinhos, chorai! – A tradição da “Serrada da Velha”
Aqui a celebração da “Serrada da Velha” na aldeia de Espinhoso, neste fim-de-semana. A qualidade dos povos também se avalia pelo modo como preserva as suas tradições e as transmite às novas gerações. Os meus parabéns ao povo de Espinhoso.
A “Serrada da Velha” é uma tradição que acontece no meio da Quaresma. Dirigida às avós, nela participa um grupo de rapazes que fazem de “netinhos” e junto ao domicílio das avós, recitam-se as “toradas” (críticas sociais), conforme o “perfil” das destinatárias. O homem do embude diz: “Lá vai a 1ª torada” e o coro acrescenta: “Chorai, netinhos, chorai!”. E os “netinhos” em coro e a baterem em latas: “Hi, hi, hi, hiiiiii”
E quem é, afinal, esta “velha” (que traz consigo resquícios do culto pagão de esconjuro das trevas invernais, da esterilidade dos campos, almejando o rumo da luz esperançosa da primavera, o tempo da fecundação e procriação)?
Trata-se, na verdade, de uma figura simbólica, uma entidade mítica (tal como a do “arco da velha”, designação popular do “arco-íris”…), conotada com as agruras da fome, privações, jejuns, repreensões e penitências quaresmais. A “velha” é, pois, a Quaresma. Serrar a velha é serrar a Quaresma ao meio, em rituais protagonizados por adolescentes com atos de rebeldia contra os rigores e a censura impostos pela Quaresma. Atos de rebeldia que apenas recaem sobre as senhoras idosas quando se reconhece serem elas as guardiãs das mais respeitosas imposições dos bons costumes locais. Em Trás-os-Montes serra-se um “toro” à porta dessas senhoras, razão por que os respetivos versos têm o nome de “toradas”.