Alexandre Parafita

Alexandre Parafita

Do cerejo ao castanho bem me amanho…

De novo os provérbios, essas fórmulas mágicas que tanta sabedoria acumulada transmitem. Saberes do povo, saberes marcantes do dia a dia rural, da economia e organização domésticas. Agora, que o outono vai crescendo, crescem as preocupações com o equilíbrio e a sobrevivência dos lares, os gastos caseiros, o sustento e rendimento dos animais.

Diz o povo, “com a vinha no outono, engorda a cabra, o boi e o dono”, que o mesmo é dizer: “Do cerejo ao castanho bem me amanho; do castanho ao cerejo é que me vejo”. Quando se dependia de colheitas próprias, e não havia o fluxo de bens de consumo dos dias de hoje, entrava-se agora num tempo de pesadelo, sobretudo quando os tempos vinham trocados. Já poucos o recordam, por isso os provérbios vão sendo cada vez mais peças arqueológicas. E para entendê-los, tantas vezes só recuperando os contextos. Esses contextos de angustiosa inquietação que os meios rurais tão bem conhecem.

“Quem não tem carro nem bois, ou antes ou depois”. Aqui se identifica uma situação objetiva da vivência e organização rural: aquele que não possuir nem carros nem bois (os bois para puxar o carro mas também para lavrar as terras), estará sempre dependente dos outros. Apenas poderá usar tais equipamentos quando aos vizinhos não fizerem falta. Terá de ajustar o seu ritmo de trabalho aos eventuais “vazios” da rotina dos vizinhos, arriscando-se a não conseguir nunca realizar as tarefas em tempo útil. Por isso, deverá tudo fazer para arranjar os seus próprios apetrechos, tornar-se autónomo, e não permanecer na dependência dos outros.

São estas as lições que nos chegam do povo antigo, mas que assentam como uma luva em toda a dimensão dos tempos que correm.

(Bibliografia: PARAFITA, A.; et al. – Os Provérbios e a Cultura Popular, V.N. Gaia, Gailivro, 2007)


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