Luis Ferreira

Luis Ferreira

Doses de mediocridade

O homem é um animal de hábitos e vícios que ao longo de toda a sua vida doseia de acordo com o momento e a maturidade. Não deixa por isso, de viver menos afectivamente algumas situações ou de ser arrastado para outras menos interessantes.
Cada um por si faz as escolhas que julga importantes e muitas dessas escolhas acabam por ser julgadas por terceiros sem que estes tenham, de alguma forma, contribuído para isso. Facto é que muitos acabam por julgar actos de um só. O julgamento é que poderá não estar em consonância com o que se pretende pelo indivíduo em causa.
No meio de tudo isto existe grande dose de mediocridade em referência à atuação de determinadas pessoas que previamente tomaram decisões que, à partida, deveriam ser demasiado sérias. É o caso do programa que ocupa espaços televisivos importantes quase de manhã à noite e que conhecemos como a Casa dos Segredos. Se um programa destes passasse na televisão pública seria caso para um levantamento geral de reclamações já que éramos todos nós a pagar as mediocridades dos que por lá se passeiam e divertem. Felizmente não é isso que se passa!
A coberto de um jogo onde alguns participam e outros não, duas dezenas de jovens são levados a comportar-se de modo diferente do habitual e a enfrentar situações no mínimo ridículas para não dizer outra coisa, com o objectivo de entreter todos os que são capazes de aguentar tal programa. A verdade é que são muitas as pessoas que acabam por se viciar no programa e conseguem ver diretamente ou por gravação, tudo o que se passa durante o dia e durante a noite. Sim, porque quase não dormem devido ao enorme stress a que estão sujeitos constantemente ou ao desassossego em que se metem.
O nível de preparação cultural que cada um dos concorrentes tem é deveras baixo. Daí que a sua actuação seja também pobre. Juntaram peixeiras com transexuais e prostitutas, tudo à mistura com pretensos galãs e aproveitadores de ocasião, donde resulta uma caldeirada muito salgada. Tudo a nu para todo o país ver e julgar ou divertir-se. Mas é disto que o programa vive. Quanto mais mediocridade melhor. Quem vê ri, diverte-se e fica preso ao desenrolar de toda a trama como se fosse uma história cujo final não se consegue adivinhar se não se aguentar até ao fim. O hábito de ver televisão torna-se um vício e não há nada a fazer, mesmo que isso seja medíocre.
De facto, a quantidade de asneiras que dizem e as cenas que protagonizam, são sinónimo de baixeza repelente e levam-nos a rotular as pessoas e o programa como medíocre. Num país que vive à beira do abismo e de um cataclismo económico, juntar mais mediocridade ao processo na tentativa de nos distrair é, no mínimo ridículo.
Mas a Casa dos Segredos não é exemplo único de mediocridade. Há outros como uma tal Liliane Marise, personagem de novela que, não se sabe bem porquê, se transformou em cantora do programa nacional e teve honras de actuação ao vivo no Meo Arena onde sete mil e quinhentas pessoas se deslocaram para a ver actuar. Caso único! Só neste país.
A personagem, embora ridícula, é normal já que se insere no papel previamente delineado e que ela interpreta muito bem. Pode-se gostar ou não, mas é a personagem criada e que num determinado contexto funciona de acordo com estabelecido. Difícil é entender como é que a personagem já de si ridícula, se transforma, graças não se sabe a quem, ou talvez se saiba (!!!), numa artista nacional, envolta em toda a mediocridade da personagem que incorpora e consegue levar uns milhares de pessoas a assistir à sua atuação. Como é que isto é possível?
Realmente há coisas difíceis de explicar e estas são algumas delas, embora haja sempre uma explicação mesmo para o que nos parece não ser explicável. Talvez necessitemos de certas doses de mediocridade para reagirmos a momentos menos agradáveis. No meio de tanta coisa medíocre, tudo o que nos fizer rir é bom mesmo que seja mau na sua essência. Haja paciência!


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