Henrique Ferreira

Henrique Ferreira

E agora, as eleições presidenciais: um passeio para Marcelo R Sousa?

No dia 24 de Janeiro de 2016, dos 9,6 milhões de eleitores portugueses talvez numa percentagem antevisível de 55% irá votar para eleger um Presidente da República, de entre oito vetustos candidatos declarados, entre os quais, pela primeira vez, duas mulheres.

Dos oito candidatos é comumente presumido que a história do acesso ao Palácio de Belém só falará de três.

Um, que andou dez anos a propagandear-se nas televisões para, agora, não necessitar de campanha eleitoral: Marcelo Rebelo de Sousa, Professor Catedrático de Direito Administrativo na Faculdade de Direito de Lisboa, co-fazedor da Constituição da República Portuguesa, amante da política nas horas livres e por diversão, quase sempre, filho de burgueses terratenentes de Celorico de Bastoe, educado na visão política do pai (Baltazar Rebelo de Sousa, ministro brilhante dos anos 60 do Estado Novo), e «enfant terrible» da elite do antigo regime.

Dizem o PSD e o CDS que Marcelo representa o eleitorado do Centro-Direita mas parece-me que, só com esse, nunca será eleito. A crer nas sondagens, Marcelo capta pelo menos 30% do eleitorado do Centro-Esquerda (PS) e 20% do eleitorado da Esquerda (BE e PCP). A confirmar-se esta abrangência, Marcelo seria representante de muitos portugueses. No entanto, pode não ser eleito à primeira volta porque, como já é dado como vencedor, o sono pode anestesiar os eleitores e derrotar o candidato. Além disso, os outros candidatos só agora estão no terreno e a sua campanha vai certamente influenciar o sentido de voto de muita gente.

Os outros dois candidatos, António Nóvoa e Maria de Belém ainda têm algumas hipóteses, sobretudo António Nóvoa, conotado com António Costa e com a Esquerda.

António Nóvoa é o único académico português com três doutoramentos internacionais. Foi Reitor da Universidade de Lisboa e conseguiu vencer as teias de aranha dos lóbis da Universidade Clássica e da Universidade Técnica e fundi-las numa só, constituindo uma universidade de dimensão internacional. Além disso, foi Coordenador do Conselho de Reitores da Universidades Portuguesas e das Universidades Europeiasj. O seu currículo académico e científico revelam-nos um intelectual preparado politicamente, especialista em educação comunitária e de adultos e nas questões da participação e dinamização social.

Maria de Belém tem um currículo mais político e administrativo e pouco académico. Técnica superior de saúde no Ministério da Saúde, foi elevada a Ministra da Saúde no segundo governo de Guterres. Depois, ficou como deputada, em silêncio, e só reapareceu para assumir o cargo de Presidente do PS. Adepta de António José Seguro, a sua candidatura parece um ajuste de contas com as segundas primárias do PS, as que Costa ganhou, arredando Seguro, eleito nas primeiras primárias.

Tanto Nóvoa como Belém têm muito que trabalhar. Marcelo não é um candidato fácil e a embrulhada da constituição do actual governo prejudicou imenso o tempo de campanha e de notoriedade pública dos dois candidatos, do independente António Nóvoa e da socialista Belém.

Ganhe quem ganhar e, para o país era bom que ganhasse Nóvoa ou Marcelo, ambos excelentes candidatos. não terá tarefa fácil porque o actual governo parece surreal. As promessas do aumento do ordenado mínimo e da abolição da sobretaxa já estão a dar que falar e, em breve, o Governo terá de modalizar, se não mesmo, desprometer, parte das suas prometidas promessas.

O ordenado mínimo tem sido objecto de debates e perspectivas vários: 1) o de 505 euros, 589 para 12 meses,  já é o maior ordenado mínimo da UE face ao ordenado médio do país, juntamente com o da França (60%, segundo Eurostat), relativamente a Janeiro de 2015. Em Espanha, por ex., é de apenas 41% (Idem: ibidem). E Paul Krugman veio hoje dizer que Portugal não tem estrutura económica para um tal salário de 600 euros (cf conferência de Paul Krugman em homenagem a José da Silova Lopes), que equivaleria, para o trabalhador, a 700 mensais para 12 meses. Para o empregador, para quem o trabalhador só trabalha 11 meses e recebe 14, representaria 763 euros mensais, acrescidos de 23,75% para a segurança social, ou seja, 181 euros, perfazendo um total mensal de 944 euros, acrescidos das despesas de formação e de seguros de trabalho, que não sei quantificar mas que, rapidamente, colocariam a despesa do ordenado mínimo, a cargo da entidade patronal, nos 1000 euros mensais.

Quanto à sobretaxa, já começou a modalização: hoje veio a público que estará decidido que o último escalão de rendimentos não terá qualquer abatimento e ninguém acredita que fique por aqui. Afinal, no dia seguinte, em 15-12-2015, a abolição da sobretaxa já só é para as famílias com rendimentos até 7.400 euros. Mesmo assim, são menos 470 milhões de euros a entrar nos cofres do Estado, por ano. Mas a procissão ainda vai no adro.

Finalmente, a reposição de vencimentos: já foi pensada para se poder não cumpri-la. Lá para Julho, quando se vir a execução orçamental, verificar-se-á que a reposição não poderá continuar.

Como escreveu João Carlos Espada, hoje, em Público, nada se pode fazer sem ter em conta a realidade. Porém, o Poder seduz mais do que os parceiros e que as parceiras «ultrasexis». Como eles  e como elas, também, leva à perdição.

 


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