Henrique Ferreira
É agora, gente do Interior?
Não sei quem inventou esta palavra Interior. Nas minhas investigações, identifiquei-a, escrita, pela primeira vez, em 1949, na Revista «Escola Portuguesa» pelo Inspector da Educaçáo Augusto César Pires de Lima.
A palavra parece-me um absurdo. Para existir um Interior tem de existir um Exterior. Se ao Interior chamássemos Exterior faria algum sentido mas a inversa já soa mal. Não sei.
«Interior» institucionalizou-se adquirindo a craga simbólica da exclusão: do processo de crescimento económico, do investimento financeiro massivo, do investimento industrial e, até, dos principais fenómenos culturais.
Mas, agora, dizem, chegou a hora: uma comissão governamental constituída quase só por gente do «Litoral e da «intelectualite», associações de cidadãos que procuram reinventar a retórica do desenvolvimento do Interior, Primeiro-Ministro que se diz «engagé» no desenvolvimento do Interior. A ver vamos.
O Estado já não faria pouco se apoiasse os investimentos inovadores e rentáveis e baixasse os impostos. Mas o capitalismo não funciona sem consumidores próximos. O Interior já não tem gente para consumir mas a gente do Interior consome-se em problemas para resolver.
De uma forma ou de outra, tem de ser o Estado a lançar o crescimento do Interior mas isso não é fácil porque há muitos «interiores» e os recursos não são muitos. Se a economia não é forte, o Estado não arrecada e, se este não arrecada, não pode ajudar suficientemente nem o Interior nem o Litoral. Tem sido sempre este o nosso drama e fala-se do desenvolvimento do Interior quando o Estado tem pouca capacidade de investimento.
É preciso ter cuidado com a retórica do desenvolvimento do Interior porque ou ela é acompanhada de programas de acção efectiva ou a frustração das populações cresce e agrava o fosso do abandono e das desigualdades regionais.