Paulo Afonso

Paulo Afonso

Euroapatia

De 23 a 26 de maio decorreram, por toda a Europa, as Eleições para o Parlamento Europeu. Em Portugal, mais uma vez, foi um período desperdiçado. Não se viu, não se falou, não se debateu, a Europa. E, novamente, ganhou a abstenção! Além, de toda a aversão, diariamente, criada sobre a Europa, não é de estranhar que os Portugueses não tomem posição sobre aquilo que desconhecem, que não percebem e que está distante.

 

A União Europeia é-nos trazida como a grande causa de todas as maleitas da nossa nação: “as metas europeias”, “as exigências europeias”, “as imposições europeias”. Naturalmente, os Portugueses não estão recetivos a ouvir falar de algo que lhes é “vendido”, diariamente, como a personificação do mal. Mesmo aqueles que resistem a mudar de canal nas entrevistas, nos debates, nas notícias, nos tempos de antena sobre a Europa, ficam com a ideia que, ou ninguém sabe o que é, porque ninguém fala da Europa, ou não querem falar, porque esperam tirar dividendos com outros assuntos.

 

A comunicação social, também, tem castrado a Europa nas entrevistas e debates, nas campanhas eleitorais, onde questionam os candidatos sobre tudo e mais alguma coisa, menos sobre a Europa. Não deixam os candidatos desenvolver raciocínios, expor as suas ideias e visões, cortando repetidamente a palavra com tempos curtos para um debate profundo e refletido. A título de exemplo comparativo, o canal público RTP1 dedicou, recentemente, 5h40min consecutivos, exclusivamente, para jogos de Futebol, e em contrapartida, dedicou, apenas, na última semana de campanha, pouco mais do que os 21 minutos dos tempos de antena, por dia.

 

Há uma grande diferença nas prioridades de informação e no entendimento daquilo que é verdadeiramente serviço público. Não falarei das estações privadas, apesar de também terem a sua responsabilidade na prestação do serviço público de informação. A desculpa é sempre a mesma, “os Portugueses não querem saber”, “não dá share”, sacudindo a responsabilidade de assumirem uma programação que prima pela aculturação da sociedade portuguesa, ao invés de a informar, esclarecer e capacitar.

 

Os candidatos até falam da Europa, dos seus programas e das suas propostas, mas a comunicação social prefere tornar o espaço informativo numa espécie de reality show da maledicência, em que ganha o casinho e o soundbite mais irrelevante para o futuro dos Portugueses e dos Europeus. Não é também de estranhar que, passados 33 anos da nossa ambicionada entrada no projeto Europeu, com uma geração ativa, nascida e criada enquanto cidadãos Europeus, estes não façam a mínima ideia do que é este projeto, a sua história, as suas conquistas e o seu funcionamento. É como criar uma criança sem lhe apresentar a família.

 

Há falhas crassas, quer da Europa, quer de Portugal, por não formar convenientemente, os nossos jovens durante o seu percurso escolar, para uma cidadania europeia (e já para não falar da formação para uma cidadania portuguesa). No entanto, os cidadãos, também, têm a sua quota parte de responsabilidade. A informação existe, está disponível, mas simplesmente há uma apatia pelo conhecimento. Numa era em que toda a informação é de fácil consumo, sendo oferecida sem ser solicitada, a Europa e os Europeus continuam à espera que os cidadãos tomem a iniciativa para se informar.

 

De facto, a participação nos nossos 33 anos de Portugal Europeu nunca foi tão baixa (31,4%), em contraciclo com a participação europeia. Uma Euroapatia que exige a reflexão de todos os intervenientes, cidadãos, políticos, partidos, comunicação social e instituições. Não podemos continuar a ignorar a Europa, a beneficiar de todas as vantagens da Europa, a gastar os milhares de milhões de euros que possibilitaram, e continuam a possibilitar, o desenvolvimento do país e, ao mesmo tempo, passar a mensagem de que a Europa é um Adamastor quando as bancarrotas, a corrupção, a falha dos serviços de saúde, dos transportes e da proteção civil, o nepotismo e despotismo são responsabilidades, única e exclusivamente, dos governantes Portugueses.

 

Devemos relembrar, todos os dias, a proteção alimentar, a construção de infraestruturas e equipamentos, o Euro, o Erasmus, o Eures, o Espaço Schengen, a mobilidade, a Investigação, a Inovação, a Paz, os Direitos Humanos, o Desenvolvimento, e todas as conquistas que só a Europa nos proporciona. Devemos relembrar, todos os dias, que somos a Europa que Portugal e os Portugueses quiseram, que seremos a Europa que construirmos, que a Europa é um projeto inacabado que não pode, nem deve ser dado como garantido, mas deve ser abraçado, difundido, estimado, para que os 500 milhões de Europeus tomem parte nesta Europa de todos para todos.

 

A Europa nunca precisou tanto de nós para a defendermos das ameaças nacionalistas e antieuropeias que espreitam e florescem por toda a Europa. Cabe-nos a nós, Europeus e máximos beneficiadores, lutar para que a Europa que tudo nos dá e garante, vença esta Euroapatia e continue uma certeza Amanhã.   


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