Manuel Igreja

Manuel Igreja

Há lodo no país

Parece que o pântano referenciado e pressentido foi encontrado ao virar da esquina neste nosso jardim junto ao mar plantado por heróis e para heróis, mas que ultimamente, mas não num repente, virou sítio impróprio para nós porque foi r disponibilizado para os de fora com dinheiro que baste para nos irmos mantendo à tona e por debaixo da lona.

Sabíamos disso, mas íamos indo. Lemos, ouvimos e lemos, mas não nos íamos nem nos vamos importando assim lá muito. Só de oras em quando, enquanto se não levanta nova e efémera fervura. Num repente, a indignação, incha, desincha e passa. A vida segue porque nos persegue.

Na nossa Democracia nova de cinquenta anos, disponibilizada, mas pouco construída, depois de outros tantos de ditadura cinzenta e castradora como é próprio de todas elas, não aprendemos a cidadania minimamente suficiente, para não permitirmos certo erros, certas imoralidades e certas faltas de vergonha que para quem a não tem, lhe permite que todo o mundo seja seu.

Nas décadas mais recente, portugueses houve para quem tudo foi seu e tudo lhe foi permitido. E nós que estamos entre eles possibilitamos. Ao nosso jeito e porque tantas vezes nos deu jeito, deixamos andar e tentamos aproveitar. Cada qual à sua maneira, por querer ou sem se aperceber foi na onda a ver o comboio passar. Foi tudo a eito.

Garantidamente passaram muitos a apitar, levando muitas oportunidades perdidas, com inúmeras potenciais valias esquecidas, muitas capacidades escondidas entre a lenha das caldeiras nas locomotivas. Por essa via, muito saber que se esvaziou ou se deslocalizou para outras paragens que o aproveitaram, aproveitam e aproveitarão.

Enquanto isso, a corrente de lava subterrânea no pântano sabido, veio ao de cima, engrossou e virou lodo. A lama é tanta e tão visível que não pode nem deve ser escondida. Tóxica, está a fazer mirrar a Democracia, uma flor sem igual apesar dos alguns espinhos no seu calde que não incomodam os que sabem porque viveram ou porque estudaram, como acontecem as coisas nos desertos com ausência do seu florir.

Os outros, os que disso não sabem porque o seu olhar não vai além do nariz pontiagudo, não lhe ligam, não a valorizam, e não a alimentam. Não sonham e não ousam. Só pousam. Por isso lhes convém o lodo, porque é no chão enlodado que germinam e se desenvolvem, os seus escusos interesses por entre a escuridão advinda da falta de ideias, de vontades e de coisas em que vale a pena acreditar e valorizar.

O Estado não soube organizar-se e agir. Depois de cristalizado com a vontade férrea e visão curta dos ditadores fora de época, somente soube proteger-se e alimentar-se autofagicamente. Não se estruturou de maneira a ser eficiente fora de portas e para além dos corredores do Poder. Permitiu que o país virasse uma federação de lóbis setoriais muito escasso de características senatoriais. Os poucos senadores morreram, mas não foram substituídos. Nada tarda, serão esquecidos.

Os bons exemplos e os efetivos saberes que mais parecem coisas de outras épocas, não interessam porque na modernidade parecem não ser convenientes nem para algumas condenáveis atitudes e posturas, eficientes. Sinal dos tempos sem modo e frequentemente sem lisura.

Daí a fissura. Por entre a  ranhura,  está a vir à superfície o lodo, neste nosso cais, neste nosso país onde todos ralham com razão, mas onde o eco dos pedidos mesmo que escutado, não tem condições para ser de conteúdo executado e considerado, por falta de condições.

O lodo está a impedir o vislumbre das saídas.



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