Ana Soares

Ana Soares

Honestidade por um canudo

Ainda quanto à (renovada) polémica das (não) licenciaturas, não podia deixar de tecer três ou quatro comentários sobre o assunto.

Primeiro, qualquer consideração que faça sobre este assunto em nada retira gravidade ao facto de se mentir sobre ser-se, ou não, licenciado. A falta de honestidade intelectual – sobretudo em quem desempenha cargos públicos – é indicador da necessidade de reeducar e reaprender o que é serviço público e os valores que devem estar inerentes à causa pública. Porque carácter – e falo abstractamente por não conhecer a pessoa em questão – infelizmente não se compra…

Por outro lado, o assunto sobre o qual surgem novas polémicas é revelador de uma mesquinhice que reina em parte da sociedade. A necessidade de mentir sobre a existência de uma licenciatura (e, sublinhe-se, que no caso a mesma não é sequer requisito para o desempenho do cargo) traduz uma mentalidade tão infeliz quanto errada. Não só a licenciatura não é garante de nada – infelizmente nem de emprego para muito profissionais que a concluíram meritoriamente – como há pessoas não licenciadas bem melhores no seu trabalho do que pares licenciados. Aliás, creio que se não houvesse esta “sede” de canudos, talvez a mancha de desemprego fosse diferente em Portugal, assim como os ordenados.

A recorrência com que se têm colocado em causa licenciaturas (aparentemente existentes) e outras que nunca o foram – recorde-se que num passado breve já tivemos desde licenciaturas concluídas ao Domingo, equivalências ad hoc e licenciaturas inexistentes – mostra que algo está mal no ensino universitário português e – diria eu – na forma como está conduzido todo o ensino. Não podem pairar dúvidas sobre a qualidade ou seriedade do ensino universitário e o ensino profissional tem de ser – de uma vez por todas – reabilitado.

Por último, acho piada a quem muito critica os tristes episódios que assistimos nos últimos dias, mas que – ainda que de modo alternativo – se faz também valer socialmente de títulos que não tem. Perdoem-me a honestidade mas, para mim, quem permite ser tratado por Dr., Engenheiro, Arquitecto e afins sem o ser, e salvo raras excepções, é porque considera que o título lhe dá um posto social e profissionalmente que não assegura de outra forma quando a maior segurança deve advir do nosso brio e trabalho efectivamente realizado. Licenciados ou não.

Até porque “a verdade é como o azeite, vem sempre ao de cima”, mesmo que não seja vista através de um canudo…


Partilhar:

+ Crónicas