[Assinala-se hoje, 9 de abril, o aniversário da sangrenta batalha de La Lys, na Primeira Guerra Mundial, onde se destacou pela sua heroicidade o famoso Soldado Milhões, natural de Murça. A evocá-lo, aqui fica mais uma história, vivida por meu avô, João Fragulho, nome de guerra].
Contava a cada passo João Fragulho como, em rapaz, ousou enfrentar, de arma em punho, o famoso soldado Milhões, herói da primeira Guerra Mundial. Dizia ele que o Milhões, após o feito que o tornou herói, tinha livre-trânsito para entrar em qualquer regimento militar, comer na nesse dos oficiais e receber honras correspondentes a major. E isto ao longo de muitos anos. Portanto onde quer que entrasse, qualquer soldado, cabo ou sargento tinha logo de lhe bater continência e dar-lhe entrada livre. Tanto mais que exibia orgulhosamente ao peito a medalha de honra com que tinha sido condecorado pelos Aliados e pelo estado português.
Ora, tocou a João Fragulho estar de sentinela no RI 13 de Vila Real numa noite de grande temporal em que o Milhões tentava entrar, todo enrolado num gato-pingado maior do que ele (o Milhões era pequeno, tinha pouco mais que um metro e meio de altura). O João, está bem de ver, não o reconheceu, e, perante a insistência do Milhões em entrar, apontou-lhe a espingarda (que por sinal nem balas tinha), e disse-lhe:
– O senhor se dá mais um passo é um homem morto!
E o Milhões não entrou. Apareceu depois um sargento que, ao reconhecê-lo, agarrou-se ao pescoço do pobre sentinela e diz-lhe:
– Ah, desgraçado que estragaste a tua vida! Então não sabes que este homem é o grande Milhões?
As hierarquias militares tentaram castigar o pobre soldado, a quem nada valeu dizer que na escuridão não tinha visto o medalhão, e que estava uma noite de temporal e que o Milhões vinha disfarçado com um gato-pingado maior do que ele. Ia ser castigado e pronto.
Qual não foi depois o seu espanto, quando, mais tarde, o Milhões o mandou chamar à messe dos oficiais, para dizer diante de todos:
