Manuel Igreja

Manuel Igreja

Joves escorraçados. Conhecimento perdido. Futuros roubados.

São coisas do arco-da-velha, como se dizia antigamente. O declínio de Portugal, o nosso rico paísmesmo não sendo um país rico, agora, pois já foi, começou com um casamento.

Diz quem sabe, que o princípio do fim da descida, sucedeu no virar do século XV para o XVI por mor de uma das cláusulas do contrato nupcial entre o nosso rei D. Manuel I, um dos melhores, e a princesa Isabel, se calhar guapa, e filha dos reis Católicos, de Espanha, como ficam conhecidos Fernando de Aragão e Isabel de Castela que Deus haja. Dizia-se a páginas tantas do documento, que por vontade dos sogros, os hereges que eram os judeus e mouros, tinham de ser expulsos de Portugal. O noivo ainda tentou que assim não fosse, mas não consegui impedir a debandada por mais desaconselhável que se lhe afigurasse a situação. Ciente que os que iam ser escorraçados eram nada mais, nada menos do que os detentores do grosso do conhecimento acerca de muitas coisas e mais do modo como estas se fazem ou se devem fazer, tentou dar a volta, mas cedeu.

Tinha de haver casório por razões de Estado, pois as outras, as do coração, na época e a este nível não faziam parte da equação. Consumou-se pois então a vassourada com muitas cenas terríveis e tristes, indo os expulsos dar a terras da Europa Central, em grande parte às terras que conhecemos como Holanda. Milhares de judeus aportaram nos Países Baixos, com seus teres e haveres, mas essencialmente com o seu saber acerca das coisas da vida. Viam para lá de até onde a vista alcança pelo que nada tardou que frutificassem os frutos germinados nos alfobres da sua sabedoria na terra das tulipas.

Portugal durante décadas ainda dominou repartindo o mundo com Espanha, mas desde logo começou à roda sem tino, transportando riquezas infindas do mundo que desbravou mas de pouco aproveitou. Acartava-as às toneladas em barcos, mas era a outras bandas que elas iam parar acrescentando verdadeira riqueza aos que as recebiam e comercializavam. Pelos nossos lados, pouco mais se via que as penas dos pavões que todos inchados nas ruas exibiam supostas fortunas. Não sei se foi praga rogada pelos que partiram á força, mas o certo é que a partir daí, as vistas lusas se encurtaram.

O horizonte ficou a pouco mais do que à distância de um palmo a partir do nariz. O quotidiano dos negócios do Estado ficou-se pela gestão do imediato. Do clipe. Isto, não esquecendo a satisfação dos interesses imediatos dos figurões que gravitam em redor da fonte do poder público colocado ao dispor de uns poucos. Cinco séculos já passaram, mas pouco se alterou. Foi maldição. Basta vermos o modo como neste nosso tempo esplendoroso se olham e tratam os jovens. Basta vermos o modo como os continuamos a enxotar, ainda que eles componham a mais preparada das gerações desde que o mundo é mundo.

Só falta dizer-lhes que este país não é para os novos. São embalados com palavreados ocos acerca do seu valor, nas a toda a hora lhes fecham as torneiras das oportunidades. Pujantes, plenos de conhecimento e de formação académica, grosso modo buscam empregos que não surgem, ou que se aparecem, se ficam pelas ofertas de salários de pouca monta. Um pouco acima do ordenado mínimo é a resposta que se ouve com mais frequência, dita a rapazes e raparigas que depois de estorricarem miolos e de derreterem milhares de euros à nação e às famílias para os estudos, querem governar e orientar a sua vida cumprindo a renovação geracional que se impõe.

Parecendo que a História se repete ainda que com outros contornos, Portugal, nós todos que o somos, continua a roubar o futuro e a roubar a decência, aos que por direito devem ter um e outro em cada mão. Como alternativa, indica-lhes a porta de saída como antigamente. Implacável e estupidamente, a relação da Nação com os cidadãos mais novos, em vez de ser um casamento feliz, é cada vez mais um processo de divórcio sem retorno e sem sentimento que fique.


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