Manuel Igreja
Longtermism: A ignóbil teoria
Diziam os antigos de muito antigamente, que os deuses enlouquecem os homens antes de os fazer perderem-se. Insanos, então eles julgando-se quase ao nível do olimpo, transtornam-se, ufanam-se e depois erram. Não será eternamente, mas é enquanto por cá andam.
Por causa disso é que quando uma pessoa pensa que viu tudo o que é de espantar, a páginas tantas se admira com algo de novo, seja na forma da daquilo com que os seus olhos se deparam, ou seja na forma de uma qualquer teoria germinada e propagada por cabeças iluminadas.
Não sei se quem isto ora lê já é sabedor ou se ouviu falar da nova filosofia chamada longtermism. Confesso que até há bem pouco eu não sonhava que existia, mas quando soube porque li, fiquei abismado. De cara à banda e quase incrédulo com o postulado pelos que a inventaram e defendem.
Dizem os doutos senhores feitos burros, pelo menos quanto a mim, que a Humanidade deve dar prioridade ao futuro de longo prazo. Defendem que dado o imenso número de humanos por nascer, a prioridade dos investimentos deve ser concentrada na melhoria da qualidade de vida desses vindouros.
Implica isso, afirmam sem se rirem, mas quiçá para nos fazerem chorar, que se deve desvalorizar a importância dos problemas atuais de modo que nos concentremos nos problemas do futuro. Dão como exemplo o acelerar da expansão espacial tida como mais importante que o se acabar com a fome no mundo onde hoje estamos.
Ainda segundo eles uma vez que os países ricos têm mais inovação e os seus trabalhadores são muito mais produtivos, salvar uma vida num país próspero é muito mais valioso do que salvar uma vida num país pobre. Torpe e imoral, despido de qualquer sentimento, mas é assim o pensar de quem acha que o planeta gira em torno da sua barriga.
Em relação ao planeta que recebemos com a obrigação de o legar em melhor estado aos nossos filhos, bufam dizendo que as próprias alterações climáticas não irão transformar-se num risco existencial e nem devem ser alvo de especial atenção por parte dos decisores políticos, pois embora possa matar centenas de milhões de pessoas agora vivas, simplesmente porque é provável que uma parte relevante da Humanidade sobreviva.
No fundo, indicam que como é expetável que venham a existir muitos mais humanos no futuro do que aqueles que existiram até agora, o que interessa é promover a qualidade dessas vidas, mesmo que hoje muitos humanos tenham de sofrer para que isso aconteça.
Podemos pensar que esta teoria é nada e criada por desmiolados sem mais nada com que entreter, mas não é bem assim. Ela advém de uma comunidade autocontida e autossustentada, confiante na enorme quantidade de dinheiro que detém e que utiliza para se espalhar com alguns figurões a passearem-se pelos corredores do poder onde pululam figurinhas.
Pensando nós um pouco, verificarmos que meia dúzia de muito ricos detém grande parte dos recursos financeiros deste nosso do mundo porque os ganhou e ganha a vender bolas de sabão. Nada custa então concluirmos que nada é por acaso e que isto anda tudo ligado.
Os poderosos ignóbeis que se julgam pequenos deuses sabem o que querem e o que dizem. Não nos dizem é tudo. São opacos. Não querem saber do futuro que vá para além da sua vil existência. Andam na branca espuma dos dias, não se importando que para os outros seja sempre noite de profundo breu.
Mas o sol há-de sempre brilhar para todos. Um dia seremos uma estrela para alguém porque fizemos por isso. Quanto a eles, duvido. Por enquanto, que vão para longe.