Teresa A. Ferreira
Madame Josephine: casamento em Alvites (VI - Cap.)
A Josephine convidou o Comissário e José Carlos, para almoçar – guardara uma surpresa. Após ter recebido indicação de que o almoço estava servido, dirigiram-se à sala de jantar. O Comissário percebeu que havia lugares a mais à mesa. De seguida entrou a Augusta, a Isabel e a Helena.
- Ainda bem que as senhoras estão cá. Conto com a vossa ajuda para deslindar este imbróglio.
- Ora, Comissário! É um prazer. – dizia Helena e as senhoras davam a sua anuência.
- Vejam se reconhecem a quem pertence esta malinha de senhora?
- Pertence à Senhora Judite, Comissário.
- Tem a certeza, Augusta?
- A menos que na festa houvesse mais do que uma igual a essa!
Os presentes entreolharam-se à procura de respostas. Ninguém se lembrava de ter visto a pochete, além de Augusta.
- Como tem tanta certeza, Augusta?
- Porque deixei cair um garfo de propósito. Quando me baixei, vi as mãos do Senhor Filipe e da Senhora Judite entrelaçadas, em cima do joelho dela, e reparei na pochete que estava no colo.
- O que tem de especial a pochete, Comissário? – questionava Helena.
- Tem um pequeno frasco conta-gotas no meio de coisas de senhora.
- Pelo odor e pela cor do líquido não dá para perceber o que é? – continuava Helena.
O Comissário abriu o frasco e deitou umas gotas em cima do prato.
- O líquido é de tom amarelado e cheira… Mil diabos me levem!
- O que descobriu, Comissário? – questionavam todos.
- Josephine: lembra-se de lhe dizer que o seu cunhado espumava pela boca e tinha um cheiro esquisito?
- Sim! Vimos isso. Mas o cheiro não era conclusivo. Parecia que havia mais qualquer coisa.
- Em cheio. Acertou em cheio. Estou em crer que foi um cocktail de químicos que o matou.
- Quer dizer que foi mais do que uma pessoa a pôr veneno na comida ou bebida do meu cunhado?
- Pode ser, pode bem ser isso. Enquanto não tivermos o resultado da autópsia… não sabemos grande coisa.
- Comissário: se me permite – indagava Isabel – pode ter sido morto por várias pessoas, uma vez que este frasco só tem uma parte do cheiro da espuma?
- É isso que me parece, mas não é nada de conclusivo.
- E se foi uma reação química entre a comida as várias bebidas e o veneno? Temos o menu com a comida e os vinhos servidos. Será que pode ajudar?
- Claro que sim.
Josephine ouvia em silencio os amigos que iam avançando na investigação, tentando juntar as pontas soltas que surgiam em catadupa.
- Comissário: temos de mandar chamar a minha irmã Dione. Ela pode ajudar-nos.
Sem hesitar, deu ordens ao imediato para ir buscar Dione ao solar e para trazer a medicação que Filipe tomava.
Dione, surpreendida pelo pedido, deixou o almoço no prato, foi buscar a medicação e acompanhou o imediato.
- Muito boa tarde, a todos!
- Oh, minha querida, devias estar a almoçar. Senta-te que já mando servir o teu prato.
- Os medicamentos, que pediu, Comissário. Está tudo aí. Em que posso ser útil? Estou aqui para ajudar a desemaranhar o que for preciso.
- Agradecido, Senhora Dione. Deixe-me analisar os medicamentos. Este, para que serve?
- Era para a tensão e o outro, que tem na mão, era por causa do colesterol.
- E este, aqui?
- Era por causa das insónias.
- E este?
- Esse era por causa das arritmias. Não sei se tinha tudo isto, ou se se fazia de doente para não trabalhar. O certo é que os tomava.
- Que médico é que o seguia?
- O Dr. José Martins. Bem o conhece.
- Temos de o mandar chamar. Imediato: trate do assunto, se faz o favor. – voltando-se para Dione, prosseguiu - Conheço, sim, e não é pelos melhores motivos.
- Ai, valha-me Deus. Não me diga que tudo isto é falso e não passou de um arranjo para que o Filipe fosse poupado a toda e qualquer preocupação ou trabalho. Eu nunca o vi mal, mas o certo é que quando vinha do médico trazia esses medicamentos.
- Depois de obter o depoimento do médico, vou mandar analisar tudo.
- Comissário! Acha provável que a mistura de álcool com a medicação e mais essas gotas que não sabemos o que são, possa ter contribuído para a morte do Filipe? – indagava Josephine.
- É muito provável. Há certos medicamentos que potenciam o seu efeito se ingeridos com álcool.
- Estamos como os cães. – afirmava Augusta – Andamos às voltas e mais voltas à procura da cauda, ou seja, do presumível culpado da morte do Filipe e da substância que lha provocou, porque de bala não foi, e cada vez se apresentam novos dados com os quais não contávamos.
- Se me permitem, tenho algo que me está a morder o cérebro?! – Isabel solicitava espaço para fazer algumas questões. – O Filipe estava mais do que habituado a beber álcool e a tomar comprimidos para essas doenças todas. A novidade é esse frasquinho da Judite que ainda não sabemos o que contém. Sabendo que o Filipe ingeriu essas gotas, porque o cheiro é igual ao da espuma que deitou da boca, será que Judite queria matar o amante? Desculpe Dione, mas infelizmente eles eram amantes.
- Posso responder, Comissário? – perguntou Josephine.
Anuindo com um meneio de cabeça, Josephine prosseguiu.
- As gotas não eram para o Filipe. - levantou-se um borburinho entre os presentes – Eram para o José Carlos, ou para a Augusta, ou para mim. O destinatário do último copo de vinho foi vítima da sua gula. O criado trazia na bandeja um copo apenas e dirigiu-se aqui ao pé de nós, mas o Filipe deitou a mão ao copo sem maneiras algumas. Judite não pode evitar a tragédia porque estava fora da sala. Mas temos outro suspeito, meus caros. Vi que esse criado trazia um anel estranho. Pode muito bem ter sido ele a pôr o veneno extra no copo. O Comissário disse que havia um cocktail de químicos.
Josephine mandou reunir todos os criados para um interrogatório. O criado do anel não aparecera. Questionou a governanta e, esta, disse que o homem se oferecera para ajudar no jantar. Tinha achado estranho, mas como eram muitos convidados, pensou que mais dois braços seriam úteis.
- De onde apareceu tal homem? Alguém o conhece? Preciso de entrar em contacto com ele.
Um dos criados levantou a mão para falar.
- Diga se faz o favor.
- Conheço-o de vista. Mora em Mascarenhas. Chama-se Joaquim e é filho da ti Marquinhas da taberna.
- Muito obrigada a todos. – agradeceram Josephine e o Comissário.
- Será o que estou a pensar, Comissário?
O Comissário fitando-a desprendeu um leve sorriso. Conseguira apanhar o raciocínio. Mandou chamar o tal Joaquim.
- E eu a pensar que isto era um caso simples que se resolvia em duas penadas…! – exclamou o Comissário.
- Avançámos bastante.
- Josephine: o que lhe parece o Gabriel, o seu jardineiro?
- Não ponho as mãos no lume por ninguém. Mas…parece-me não ser pessoa para…. Quanto ao quadro, fui eu que lhe pedi para o alterar. Não creio que tenha mais a ver com o caso do que isso. Nem sequer participou no jantar. Mas posso mandá-lo chamar.
- Sim, se faz o favor.
- Entre e sente-se, Gabriel. O Comissário quer fazer-lhe umas perguntas.
- Deu conta de alguém remexer nos produtos químicos dos pomares e dos jardins?
- Por acaso dei, mas não foi caso grave, não estragaram nada.
- Veja se conhece este químico? – e deitou umas gotas num prato.
- Parece-me um herbicida misturado com óleo. Cheira a ovo podre…. Acho que também contém enxofre.
- Viu alguém andar a rondar a casa onde guarda os químicos da agricultura?
- Ando sempre no campo…. Mas ainda bem que pergunta.
- Ai, sim?! Então diga.
- Uma senhora que esteve cá no solar, julgo ser a mãe do noivo da menina Cecília, andou por ali a rondar. Dei conta quando vinha trazer o quadro. Disfarçou dizendo-me que o jardim estava muito bem cuidado.
- Em cheio, Comissário. Olhe, Gabriel: não vai haver casamento entre a Cecília e o Arnaldo.
O olhar do Gabriel, tal como o semblante, iluminara-se.
- Não haverá este casamento, mas pode haver outro. – Josephine piscou o olho ao Gabriel.
Nisto, a secretária de Josephine, bateu à porta pedindo licença para falar com a Senhora. Alguém acabara de chegar e queria muito vê-la.
- Antoine...mon amour! – correu para os braços do marido. Beijando-o sofregamente, envolvia-o num abraço delicado e doce, com sabor a saudade. Assim ficaram por longos momentos aplacando as saudades.
Continua...
Igreja Paroquial de Alvites / Igreja de São Vicente
© 𝑻𝒆𝒓𝒆𝒔𝒂 𝒅𝒐 𝑨𝒎𝒑𝒂𝒓𝒐 𝑭𝒆𝒓𝒓𝒆𝒊𝒓𝒂, 27-07-2023
𝑵𝒂𝒕𝒖𝒓𝒂𝒍 𝒅𝒆 𝑻𝒐𝒓𝒓𝒆 𝒅𝒆 𝑫𝒐𝒏𝒂 𝑪𝒉𝒂𝒎𝒂,
𝑴𝒊𝒓𝒂𝒏𝒅𝒆𝒍𝒂, 𝑩𝒓𝒂𝒈𝒂𝒏ç𝒂, 𝑷𝒐𝒓𝒕𝒖𝒈𝒂𝒍.
Este texto é uma obra de ficção. Qualquer semelhança com a realidade é pura coincidência.