Adelino Martins

Adelino Martins

Minha primeira Crónica

Estimados Leitores,

É com muito gosto que, a parir deste momento, vou ser colaborado ativo do nosso jornal, esperando que nos venhamos a dar todos bem e, sobretudo, que eu não vos venha a desiludir, pois tudo tentarei fazer pra que assim não aconteça, como aliás há muitos anos vem sendo timbre dos Transmontanos.

Advirto de que tenho uma maneira d’escrever ao meu jeito e que, se me permitirdes, gostaria da continuar, pois já que sou diferente dos outros em outras coisas, também aqui faço questão de ser. Pra já ides ler algo com que prefaciei o meu segundo livro de poesia intitulado “Vive mais se ajudar a viver” e como subtítulo (contos poéticos) publicada a 1ª edição em setembro de 2022. Ao lerdes o que nele escrevi, já ficareis a saber um pouquito de mim, todavia espero apresentar-me a vós pra que possais ficar mais elucidados de quem estais a ler, que até podeis ficar surpreendidos…

Estou convencido de que entre transmontanos desde que haja boa-fé de parte-a-parte, corre sempre tudo bem. Sei que temos fama de não sermos bons de dar o pelo, o que é certo, mas isso é só quando nos querem pôr a pata em cima, por que por bem até damos a camisa que trazemos às costas, como sói dizer-se. Sim porque também temos fama de nos abrir logo pra quem nos aparece pela primeira vez e que, mesmo sem sabermos quem é, anda logo à frente o presunto ou o salpicão. A propósito, estando eu em viana do Castelo, conheci um casal de franceses que traziam o endereço de familiares duns portugueses seus vizinhos lá em França. Vim com eles, no meu carro, e fomos a casa deles, que moravam nos arredores de chaves. A receção foi excelente, pois saiu logo a merenda onde não faltou bom presunto e salpicão bom vinho e bom pão, cozido naquele dia pela manhã, e a pinga era de se lhe tirar o chapéu. Os franceses ficaram de tal maneira impressionados que, depois entre outras coisas, comentaram comigo, numa carta, “…até nos deram presunto e tudo”. A casa era meio- senhorial de lavora farta.

Tenho na minha intenção escrever artigos d’opinião, mas também ireis ler algumas das minhas poesias, umas que escreverei diretamente pra vós, através do jornal, e outras que já constam nos meus livros. Mas claro que, pra quem não as leu, têm a mesma novidade. Então aí vai:   

Este bocado de mim – onde padeço

dedico-o aos mais baixos deste país

que podiam subir bem mais de raiz

se não passassem por tanto tropeço:

Em jeito preambular

O que por aqui abaixo vou poetizar

Gostava que ficasse em lembrança

Por ser trabalho dum trasmontano

Do harmónico distrito de Bragança,

Com sua capital a nordeste raiano

Que de Nordestina a quero batizar

E de amendoeiras em flor poetizar.

Sobre o meu distrito, direi somente:

Com tanta Bela Natura que ele tem

É um dos que mais progride no país.

Por tal, aconselho visitá-lo, também

Pra lhe conhecer génese, a sua raiz.

Gosto que o vejam bem competente

Como trasmontano genuíno e crente.

Visita então o quinto maior canteiro

Deste jardim entre a Espanha e o Mar

Que ele t’acolhe com a hospitalidade

Que lhe advém da entranha peculiar…

Que garanto que ficarás com saudade

Como eu fico, quando o visito arteiro

…a tua cara-metade, se fores solteiro!

Tive a sorte de nascer no seu décimo

Segundo concelho – ali o de Vinhais

E em um dos seus lugares, Vilarinho

De Lomba – que o esquecerei jamais

Embora seja ali escravo e pequeninho

Pra mim, este Vilarinho não é péssimo:

Sou seu filho e seu defensor acérrimo…

Também, meu bom possível Seguidor,

Por interessantes razões t’aconselho,

Junto ao parque natural, montesinho,

A visitares a capital do meu concelho,

De preferência dia claro, não sozinho:

Finaliza com posta à mirandesa, Leitor,

E tintol de Nunes – na tasca do Heitor.

E de Trás-os-Montes, dirás tu chega.

Quererás saber algo mais do autor.

Eu, no teu lugar, compreendo tudo

Que pensas, dizendo-te, meu Leitor,

Ante teus desejos não ficarei mudo

E dar-te-ei, sobre mim, uma achega,

Ciente de que, se esvoaço, sou pega.

Assim, deste que tens aí na tua frente,

Vais saber de tudo que te vou contar

Desde que no bel’ Vilarinho fui parido,

Me conheço e bem o possa recordar:

Nasci nu, mas por louco amor vestido;

Depois, uma-atrás-e-outra-à-frente,

Ali fui crescendo lento, mas contente!

Meu enxoval, tal fora o da minha mãe,

Foram trapinhos velhos – lavadinhos.

Eu, entre quatro, fui primeiro a chegar

E, sem o resto, fui criado com carinhos.

Apesar de tudo, não me posso queixar:

Tanto por todo lado como eu, também,

E que, infelizmente, se ficaram aquém.

Fui crescendo como pude e me deixaram

Fui pastor dos sete aos dez anos de idade

Fui estudante entre os dez e os onze anos

Fui criado de lavoura, e tudo faz saudade…

Fui esquecendo tais momentos tacanhos

Fui e vi os que pelos abutres marcharam:

Fui por eles, mas nem sequer me ligaram!…

Fui por ali aos tombos crescendo e, adulto,

Fui parar às Astúrias para ali ser mineiro;

Fui regressado a Portugal um ano depois;

Fui na Grande Briosa um feliz marinheiro;

Fui assim arredado para sempre dos bois;

Fui mais tarde entristado de pensar culto;

Fui incomodado por pensamento inculto…

Fui depois turista em Luando sem dinheiro;

Fui escriturário em Moçâmedes, hoje Namibe;

Fui fiel em Fiel d’Armazéns neste município;

Fui polícia em Angola, e aqui muita sorte tive;

Fui obrigado a voltar aqui ao meu princípio;

Fui remador solto em barcos sem timoneiro;

Fui, enfim, humilde a sair de mim altaneiro…

Sou, apesar de tudo, por aqui um sortudo;

Sou, então, na polícia marítima reintegrado;

Sou na cidade mais bonita deste Portugal,

Depois duma estadia nos adidos, colocado;

Sou quem sofreu acidente viário quase fatal;

Sou quem, nem aqui, ficou triste com tudo

Que m’aconteceu e até o caso mais bicudo!

No qual, como não morri, tive muita sorte:

Tive a sorte que todos têm se não morrem.

Mas eu, como sou modesto, desejo pouco,

Pra que de sôfrego guloso não me tomem.

Mas os leitores não pensem que sou louco:

Sou mero poeta do povo, com rumo norte,

Que deixo pra outros ajuizar do meu porte.

Agora, passados vinte e seis reformado,

Caminho, portanto, pelas veredas do fio.

Sei já não ter direito a muito me desejar,

Mas os setenta e oito lançam-me desafio:

Morre a poetizar e pela grei sabe pelejar!

E lutarei sempre e, pela poesia armado,

Vencerei com Calos e Suores irmanado.

Só pedirei à Mãe-Natura para me ajudar

Nesta-cruzada-poética-singela-saudável

Prometendo aqui ao meu sensível Leitor,

Que me vem dando apoio incomparável,

Continuar a luta pelo baixote, com Amor,

Por ser a quem lhe apertam mais o aziar

E o que, agora e sempre, está a precisar!

 


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