Henrique Ferreira

Henrique Ferreira

Mudança governativa em perspectiva

Começou hoje a campanha eleitoral e bem é necessária para ajudar a definir o voto de 20% de possíveis votantes indecisos. É necessária porque, na indefinição, muitos desses eleitores não irão votar. E é necessária porque o voto nulo e o voto em branco não servem para nada, ao contrário do que muito boa gente pensa. O voto em branco não só não ocupa qualquer lugar na Assembleia da República como não contribui para alargar o leque de votos válidos na contabilidade da distribuição de deputados nacionais.

Até hoje, dia 24 de Fevereiro, pouca utilidade tiveram os debates entre candidatos nas televisões. Houve pouca informação mas muita demagogia. Houve muita mentira e muita ignorância sobre a estrutura internacional e nacional do país bem como sobre a conjuntura interna deste. O desconhecimento transversal da realidade do país foi confrangedor em todos os candidatos.

Uns candidatos mais que outros souberam utilizar a sua arte retória e argumentativa para vender o seu «peixe». A nadar muito bem na piscina esteve Luís Montenegro que, recorrendo aos seus dotes argumentativos de jurista, conseguiu «vender» bem alguns aspectos do seu programa de Governo. Porém, a sua dose de irrealismo é tal que, se ganhar as eleições e cumprir o programa, teremos novo resgate do país dentro de quatro anos.

Mal esteve quase sempre Pedro Nuno Santos. Confrangedor, por vezes, pelo desconhecimento que o ex-governante revelou face às virtudes e defeitos do Governo em que participou mas também em termos de cultura política e geral do país. O PS escolheu o candidato ideal para perder as eleições. Ao ponto de o próprio candidato atirar a toalha ao chão alienando o eleitorado do Centro. Se Mário Soares fosse vivo, remorder-se-ia todo.

Muito mal também esteve André Ventura. Não parecia nem advogado nem deputado. Deixou-se anular e enredar em quase todos os debates. Vamos ver como se vai sair na campanha eleitoral mas tudo indica que vai baixar muito: tanto pelo voto útil na AD como pelas contradições em que foi caindo. Os seus temas de campanha são muito pertinentes mas, vendidos assim, venha o diabo e leve-os com ele para o inferno.

Luís Rocha esteve quase sempre muito bem. Foi o único que foi coerente com a ideologia do Iniciativa Liberal. Mal iria o país se fosse objecto de um tal programa mas, ao menos, foi coerente. E foi uma excelente namorada de Luís Montenegro mas à maneira antiga: submissa e obediente.

Mariana Mortágua bem tenta reabilitar a esquerda do caviar mas os tempos não estão para a esquerda. A fome não é amiga da esquerda mas da direita e os tempos parecem estar propícios para as demagogias de direita. É o eterno retorno.

Os outros tentaram sobreviver em águas turvas mas, além de turvas, estão revoltas.

Para o PS, foi a pior altura possível para a virgem ofendida de António Costa atirar a toalha ao chão. De Almeida Garret a António Costa, passando por José Sócrates, o narcisismo é uma má postura num governante. E a imagem que António Costa deixa, sobretudo pela forma como organizou o XXIII Governo Constitucional, é a de um político que só sobrevive com a clarividência do Partido Comunista e do Bloco de Esquerda. Mau de mais para um PS que quer ser balança do regime e que se perde completamente nas políticas de direita quando governo.

Com a perspectiva da vitória da AD, podemos esperar que o Sistema Nacional de Saúde  e o Sistema Educativo piorem bastante e as entidades privadas melhorem mais. No entanto, os orçamentos da saúde e da educação engordarão, mas canalizados para os privados. Não os podemos censurar: é a natureza deles. Quem lhes dá o voto é que tem obrigação de saber o que eles todos são. Desde o PS aos «namorados» da AD.

Os votos no IL, no Chega, no BE, no Livre, no PAN e no PCP têm uma utilidade folclórica: matizam a «fauna» do Parlamento e quebram os pensamentos monocórdicos. Porém, em pouco contribuem para mudar a orientação dos dois partidos do Centro: o do Centro-Esquerda (PS) e o do Centro-Direita (PSD). Saber como vai conviver o PSD com o pensamento de Direita já é um aliciante para acompanhar e analisar o próximo Governo do país pela AD.


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