Luis Ferreira
Nem tuge nem muge
Na ignominiosa rotunda do pensamento humano, passam repentinamente opiniões onde uns dizem o que não querem, outros o que alguns querem ouvir e outros o que nem sequer imaginavam ouvir. Enfim, são as particularidades das opiniões de cada um de nós que, como seres pensantes, imitimos o eco do que nos passa pela cabeça.
Na verdade, neste palco redondo que habitamos, nada mais somos do que atores de uma peça grandiosa onde cada um desempenha um papel diferente, mas que consubstancia a união geral para a manutenção pacífica de todos. Uns são sérios, outros palhaços, outros nem uma coisa nem outra, mas todos se fazem ouvir para gaudio dos palhaços ou para a introspecção dos outros. A racionalidade de cada um fará o resto.
Após imitirmos um juízo de valor sobre o que se diz ou disse, acabamos por tirar conclusões finais que mais não são do que o corolário de um conjunto de premissas avulsas, por vezes sem sentido, mas que fazem parte do dilema. O curioso é que as premissas podem mudar e mudam constantemente fazendo variar ou não as conclusões. Parece que andam todos à deriva, em alto mar, ao sabor das ondas e da ventania.
Se atentarmos no que se tem dito na nossa política caseira sobre as particularidades de atual governo e da necessidade de o derrubar e partir para novas eleições, ficamos deveras siderados pela incongruência de algumas afirmações e igualmente pelas conclusões que alguns acabam por daí retirar. Sabemos perfeitamente que este governo tem governado mal e que Costa está arrependido pelas opções e escolhas que fez para liderar a maior parte dos ministérios. Foi um desastre completo. Ele sabe disso, mas não pode dizê-lo, obviamente, pois seria admitir o erro. Dias houve em que nem tugiu nem mugiu. E que haveria de dizer? Estava à vista de todos.
Contudo, a oposição, a que existe, foi atirando algumas flechas para ver se acertava no alvo, mas este era demasiado amplo para se conseguir acertar no centro e marcar pontos.
Começaram a alinhar-se algumas ideias dos partidos da oposição no sentido de chamar à liça o Presidente Marcelo e aqui, uns concordavam e outros discordavam plenamente. Marcelo não é desprovido de inteligência, de todo, e soube responder às várias sugestões apresentadas pelos jornalistas. Não, não é o momento, dizia. E com razão.
As sondagens que surgem sempre nestas ocasiões para lançar o pânico nas opiniões alheias e baralharem tudo, contribuíram para que partidos como o Chega e o PSD se posicionassem para eventuais surpresas. E eis que chegam, nas cabeças pensadoras desses atores, certezas brilhantes. O Chega tem a certeza que o PSD terá de o chamar para um próximo governo se ganhar as eleições e quiser governar contra o PS. Montenegro, primeiro, nada disse. Nem tugiu nem mugiu. No entanto com o andar da carruagem e com novas sondagens, resolveu dar certezas também. Governa se tiver maioria ou não, mas com o Chega não. Renega os princípios de Ventura e com razão, digo eu. Extremismos desta natureza não são admissíveis, mas há sempre quem neles acredite!
Afinal o que ontem era verdade, hoje já não é? Em que ficamos? Montenegro já fala em maioria absoluta e curiosamente, Ventura afirma que em 2024 as sondagens lhe darão maioria à frente de Montenegro. Assistimos então a pretensões lideradas, não pelo racionalismo dos líderes partidários, mas sim pelas sondagens alheias que se limitam a analisar as respostas de menos de um milhar de pessoas, às perguntas intencionais que os entrevistadores lhes fazem.
Catarina, já de saída, pouco ou nada adianta sobre isto. Sabe que não pode concorrer neste campeonato e deixa à sucessora esse ónus. Perde o BE um bom elemento, mas enfim, nem sempre nem nunca.
Perante esta luta de galos de capoeira, em que o desfecho é incerto, todos assistem de camarote, mesmo sem ter pago bilhete. O final não está para já. A luta continua. E continua porque Marcelo quer que continue e porque o momento não permite interromper a luta. Eleições nem pensar!
E Costa? Nem tuge nem muge. Calado que nem um rato, sem saber o que fazer e sem grandes alternativas, limita-se a julgar as premissas que todos adiantam neste dilema governativo, para tirar conclusões que não serão, sem dúvida, do seu agrado. As culpas ninguém as quer e muito menos ele que há tanto tempo governa. Quem vier que feche a porta. Pois é, a porta da desgraça e do descrédito. A porta da desgovernação. Nada disto é muito diferente do que tem acontecido nos últimos momentos de transição governativa. Enfim!