Chrys Chrystello
O mar dos Açores é de quem?
Crónica 197 o mar dos Açores é de quem?
Da última vez que vi e consultei a frase em epígrafe foi quando um dirigente supremo do governo da Região Autónoma dos Açores disse qualquer coisa parecida com “o mar dos Açores é nosso” e logo apareceram dias depois 1400 marinheiros, soldados e aviadores, a pretexto do 10 de junho, e ainda ficaram uns fuzileiros mais uns dias para fazerem uns exercícios de exemplificação do desembarque rápido de tropas numa praia ao lado de Ponta Delgada.
A política relativa ao mar também está entre as prioridades açorianas, salientou Vasco Cordeiro, nomeadamente porque “só à conta dos Açores, em termos de área de mar, há cerca de um milhão de quilómetros quadrados atualmente”, o que dá a dimensão “da importância que o arquipélago tem para o país”. Vasco Cordeiro defendeu a existência do programa POSEI, de apoio específico às regiões ultraperiféricas, também às pescas
Mar dos Açores é a designação dada ao conjunto formado pelo mar territorial e pela zona económica exclusiva em torno do arquipélago dos Açores, a que o amigo José Soares chama hidrotório. Não dispomos de uma máquina do tempo que nos permita saber tudo sobre a origem da vida. Para animais e plantas, sobretudo para as que têm partes duras, temos o registo fóssil, mas para os primeiros microrganismos, seres unicelulares, não é tão simples obter pistas. Atualmente, são conhecidas nos Açores cinco fontes hidrotermais (‘Lucky Strike’, descoberta em 1992, ‘Menez Gwen’, em 1994, ‘Rainbow’, em 1997, ‘Saldanha’, em 1998 e ‘Ewan’, em 2006), todas elas localizadas a sul do arquipélago açoriano, e a serem alvo de estudos científicos. Um dos objetivos da investigação científica nas fontes hidrotermais de profundidade é encontrar respostas para setores como a Medicina e a indústria farmacêutica, que procuram descobrir propriedades anticancerígenas nesses organismos, que sobrevivem em condições extremas (libertação de gases e temperaturas elevadas).
Ora um milhão de km2 a acrescer á plataforma marítima de Portugal, como atualmente se debate no seio da ONU, é muita riqueza para deixar a sua exploração e negociação aos pobres e malformados quadros técnicos da Universidade do arquipélago e carece de ser devidamente acompanhada e negociada pelos peritos em todas essas áreas do conhecimento científico e comercial existentes na Corte de Lisboa.
Não interessa o que está previsto na Constituição nem o que consta no estatuto de Autonomia da Região que, aliás, isso nunca impediu Lisboa de fazer o que muito bem entende. Como os Açores são Portugal deixemos Portugal tratar desses assuntos demasiado sérios e técnicos.
Oito anos depois da entrega da candidatura nas Nações Unidas, Portugal começou em agosto 2017 a defesa da proposta de extensão da plataforma continental para além das 200 milhas marítimas que constituem a Zona Económica Exclusiva (ZEE) do país. Se as pretensões nacionais forem atendidas, Portugal poderá dobrar a extensão do seu território marítimo, dos atuais dois milhões para quase quatro milhões (3,8) de quilómetros quadrados.
O reconhecimento da plataforma continental implica que Portugal fique com a jurisdição do solo e subsolo marítimos (não da coluna de água e respetivos recursos marinhos, como acontece na área da ZEE). As "possibilidades de exploração económica" - por exemplo de minerais ou de vários produtos marítimos usados em medicamentos ou cosmética - foram um dos pontos destacados pela ministra do Mar, para além das potencialidades no campo das energias renováveis. Portugal tem, atualmente, uma ZEE de 1,7 milhões de quilómetros quadrados, a terceira maior da União Europeia e a 11ª do mundo. Atendendo a que Portugal Continental tem pouco mais de 92 mil quilómetros quadrados de área, a extensão do território marítimo em mais 350 milhas significará que a área de mar será 40 vezes superior à terrestre.
A vigilância da ZEE portuguesa é exercida pela Marinha Portuguesa, Força Aérea Portuguesa, pela Autoridade Marítima Nacional, Polícia Marítima e Direção-Geral de Recursos Naturais, Segurança e Serviços Marítimos, que através de meios próprios executam missões de:
- Fiscalização e controlo das atividades de pesca;
- Deteção e controlo de atividades ilícitas;
- Imigração Ilegal;
- Deteção de poluição marítima;
- Controlo do Tráfego Marítimo;
- Operações Militares;
- Busca e Salvamento.
Como os Açores não têm meios próprios, nem marinha, nem aviação, resta concluir que o mar dos Açores só é nosso em sentido literário, bom para poetas e prosadores escreverem, mas na prática será em Lisboa que tudo será decidido, como aliás é norma num estado unitário, uno e indivisível…
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Chrys Chrystello, Jornalista, MEEA/AJA (Australian Journalists' Association - Membro Honorário Vitalício
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