Alexandre Parafita
O poeta marginalizado
Faz hoje (17-1-2016) 21 anos que morreu. Coube-me, há 21 anos atrás, enquanto jornalista, fazer a cobertura do funeral na pequena aldeia transmontana. Na porta do cemitério, à viúva, entre os gestos e palavras de conforto que a rodeavam, alguém perguntava: “Como acha que Miguel Torga desejaria ser recordado?”. A resposta foi apenas: “Leiam-no e estudem-no nas escolas”.
Um apelo que parecia então escusado. Todos nós, que nos fizemos gente antes desses 21 anos, crescemos dentro dos seus versos. Mas tinha razão a viúva de Torga. Mal o poeta fechou os olhos, o seu nome foi caindo no esquecimento. À popularidade de que usufruía em vida, observador interventivo que era, depressa se tornou no escritor “mal-amado”, praticamente retirado do universo escolar. O seu teatro e a sua poesia já não moram nos manuais. Alguns dos seus versos apenas têm tímidas e diluídas aparições em obscuras “metas” de aprendizagem sem explícito empenho na sua leitura. O compadrio das elites ditou-lhe o obscurecimento mediático quando entrou na moda um snobismo cultural que se agarra às frivolidades das grandes urbes, atirando para a valeta tudo o que soa a etnicidade, a rural, a provinciano. Miguel Torga pagou caro por isso. O seu nome soçobrou no emaranhado de corporações que se movem no reino da cultura em Portugal. Que vozes se ergueram quando o seu nome foi ignorado na famosa obra Século de Ouro - Antologia crítica da poesia portuguesa do século XX, organizada em torno das escolhas de 73 ensaístas da nossa melhor linhagem intelectual?
Resta-nos a nós, transmontanos, continuar a honrá-lo como ícone maior da nossa identidade e da nossa cultura.