Alexandre Parafita

Alexandre Parafita

O povo e as alterações climáticas

Contam os mais antigos em terras transmontanas que, quando Nosso Senhor e S. Pedro andavam pelo mundo, a dada altura resolveram mudar-se para o Céu.

            – Vamos embora, Pedro! – disse Nosso Senhor

            – Vamos, como?! – estranhou S. Pedro. – E quem fica a governar o mundo?

            – O homem! – respondeu.

            – Bô!? E se ele governa mal? – insistiu o santo

            – Trocamos-lhe os tempos! – concluiu Nosso Senhor.

“Trocar os tempos”, na hermenêutica popular, é uma velha expressão alusiva aos caprichos da meteorologia que desorientam os labores agrários (chuva e tempestades quando deveria fazer sol, geadas fora de tempo, ventos ciclónicos inesperados, calor intenso e secas prolongadas…), fenómenos que os antigos interpretam como admoestações do Céu face às “transgressões” terrenas. E daí os frequentes apelos à intermediação de S. Pedro quando se almejam os favores meteorológicos.

Ouvi o conto popular a um idoso do concelho de Vinhais, que, com ele, metaforizava ao seu jeito os dislates civilizacionais dos novos tempos e as suas nefastas consequências, como se houvesse uma profecia implicada nessa antiga parábola. Como se, pela mão do homem moderno, estivesse iminente a rotura de uma coerência cósmica que vem traçando o destino da humanidade.

Em boa verdade, o homem tem nas mãos o poder de governar o mundo e pode fazer dele o que quiser, incluindo afundar-se com as atitudes que toma. E as alterações climáticas com as secas prolongadas (geradas pela degradação da camada de ozono e aumento do efeito estufa na Terra) em consequência da irresponsabilidade que grassa nos governos dos estados mais poderosos, pode ser, a prazo, apenas um dos lados mais irrefutáveis dessa profecia.

JN, 17-9-2019

 


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