Manuel Igreja

Manuel Igreja

O Rei borrou a escrita

Juan Carlos de Borbón e de mais não sei quantos, borrou a escrita toda, com o devido pedido de desculpa perante vossas senhorias, por mor deste meu modo de dizer, assim menos elegante.

O rei emérito de Espanha entornou o tinteiro todo sobre as páginas que nos falam da História daquele país e de mais a sua obra no último meio século mais ano menos ano. O rei que não soube portar-se bem na sua vida pessoal, andou muito mal e com a dignidade ausente.

Não foi decente perante todos e muito menos mediante a sua gente. Fez obra, uniu o que parecia e parece ser de união impossível, congregou, mas agora desbaratou. Foi um grande estadista, mas foi também um malabarista.

Fez uns telefonemas que lhe valeram financeiramente a pena, foi um pinga-amor com amantes com casa montada, mas cruelmente para ele, tudo lhe vai valer nada, porque para memória futura sobressairá a pagina final do livro sobre a sua pequena/grande história. No entanto o mais importante e preocupante, é que no fundo a novela da realidade indecente que se revela neste verão quente, mais não é do que um caso entre muitos outros de igual jaez que sucedem por aí sem serem por acaso.

Num tempo em que bandoleiros engravatados e escondidos no céu escurecido das novas tecnologias mandam e comandam a seu bel-prazer, os detentores de cargos públicos deixam-se aprisionar atados a interesses imediatos e pouco pacatos, porque se deslumbram com belezas e com luxos que reluzindo na estratosfera estão mesmo à sua espera.

Não se respeitando e não se dando ao respeito, vendem a alma ao mafarrico prostituindo-se para terem vida de rico. Adquirem influência enquanto estão no Poder. Depois, regalados traficam cordelinhos que mexem quase sem mexerem os rabinhos. Salvo seja.

Enquanto isso e também por causa disso, o nosso mundo caminha para o abismo metido no comboio da ganância que segue pela linha da ignorância alimentada pela força do ódio. A locomotiva segue com toda a indiferença porque aos cidadãos lhes falta o sentido de pertença.

Não se revêm e não creem. Só querem, mas desesperam. Deparam-se a toda a hora com líderes que borram a escrita, acreditam cada vez menos, mas ouvem cada vez mais cantos de sereias que não falam de ideias, mas falam de soluções aos arrepelões.

O conhecimento do mundo e das sua coisas passadas diz-nos que nada acaba e tudo se transforma. Esperemos que das escritas borradas surja algo que ainda se consiga ler de maneira a que por entre as palavras eternas e inteiras ressalte a palavra decência que alimenta a flor da democracia que esmorece, mas jamais desaparece.

Digo eu. Não sei. 


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