Luis Ferreira
O vírus não é racista
Num tempo em que todos correm sem saber exatamente para onde, ainda parece haver quem tenha a certeza de alguma coisa. Possivelmente têm essa noção, mas não passa disso mesmo. Não sei se andam a fugir de alguma coisa ou de encontro a outras coisas, mas correm como loucos. Parece-me que vão de encontro a qualquer coisa, seja o que for, mas vão.
O tempo de veraneio a que alguns têm direito neste agosto tão diversificado, já que chove no Norte e há Sol e calor no Sul, vai sendo marcado pelo mesmo tema que nos entra pela casa dentro há já quatro ou cinco meses e do qual estamos todos fartos. Falar do vírus e das suas vagas que atropelam os mais audazes e os menos prevenidos em todo o mundo, é recorrente. O mundo parou com a chegada deste Corona vírus. Nomes, tem e demais, mas todos dizem o mesmo. Morte.
Todos esperávamos que aproveitasse este tempo de férias para ir para bem longe, mas tal não aconteceu e instalou-se com armas e bagagens em todos os recantos deste planeta. Resta saber se não veio de outro recanto do universo, enviado por alguma nuvem de poeira cósmica. A verdade é que chegou e ficou, obrigando todos a obedecer-lhe como se fosse o rei único e universal. E será.
É rei de todos os povos e raças. Não é racista. É rei e a todos castiga sem dó nem piedade, especialmente os que não obedecem às suas regras, fazendo lembrar os de antigamente, os que tinham poder absoluto e o justificavam como sendo divino. Não, este não será divino, mas parece. Castigar, castiga.
Ora, não sendo este rei, racista, que lei permite que alguns o sejam impunemente? Num tempo em que não nos preocupamos muito com assuntos paralelos ao vírus, há pessoas que resolvem divertir-se com o facto de estarem em confinamento e enviarem e-mails aos amigos a ameaçar os que calham, assustando-os ainda mais que o próprio vírus. Não está certo. Brincadeira tem hora! Podiam aprender com o rei universal que, parece não os amedrontar. E se fossem castigados pela vara da justiça vírica? É que muitos são castigados sem nada ter feito que justifique tal sanção.
Pois, este ato racista, altamente condenável numa sociedade democrática, sendo antidemocrático, merece castigo. Mas como castigar quem não mostra a cara? Pode ser que acabando o confinamento a que estão sujeitos ou se sujeitam livremente, saiam à rua e mostrem, além do suposto nome, a face da injustiça que o rodeia.
As raças não passam de designações que os europeus atribuíram aos povos que foram descobrindo ao longo dos séculos. Eram diferentes na coloração da pele, só isso e assim uns passaram a ser negros, ouros amarelos ou vermelhos e outros brancos. Pois, mas a origem de todas as raças está em África onde todos eram negros e a coloração da pele só mudou devido à menor incidência do Sol e à diferença climática dos diferentes locais ao longo de muitos milhares de anos, o que nos leva a ter uma mesma origem ancestral. Isto não nos torna diferentes nem permite que sejamos racistas. Nada o justifica e muito menos justifica certas atitudes completamente antidemocráticas.
Em pleno século XXI e inseridos em sociedades democráticas que têm por trás anos de luta para se afirmarem com tal, não é admissível que subsistam radicalismos deste género em pequenos recantos de alguns países, especialmente aqueles onde o vírus ainda não entrou.
O Verão está a dar os últimos suspiros, mas o receio deste vírus que não desaparece não quer ir de quarentena, mas vai-nos obrigando a fazê-la. Contra a nossa vontade, vem aí um tempo de aperto e de muito receio onde muitos serão apanhados por este rei universal, cujo desfecho será sempre imprevisível. Não sendo este rei de estirpe rácica, bem podia apanhar os que o são e ensiná-los a temer as leis que regem este mundo de todos nós.