Luis Ferreira

Luis Ferreira

Obesidade mental

Sabemos bem que a obesidade, tão falada nos últimos tempos e olhada como causa de variadas doenças é excesso de gordura física devida a uma alimentação desregrada, mas não só. Há outros tipos de excessos que conduzem aos excessos físicos.

As notícias que hoje circulam tão rapidamente, alertam-nos para os perigos da obesidade, contudo, as próprias notícias são, por si só, tantas e tão alarmantes que são o exemplo da própria obesidade informativa.

É altura de notarmos que os nossos abusos no campo da informação e conhecimento estão a criar problemas tão ou mais sérios que os decorrentes da obesidade física. A nossa sociedade está mais atafulhada de preconceitos que de proteínas, mais intoxicada de lugares comuns que de hidratos de carbono.

As pessoas viciam-se em estereótipos, juízos apressados, pensamentos tacanhos e condenações precipitadas, de tal modo que todos têm opinião sobre tudo, mas conhecem pouco ou nada sobre as coisas. E isso parece não interessar muito. A opinião é livre.

Os jornalistas são hoje os “cozinheiros” da “fast food” intelectual e, os comentadores, editores e filósofos contribuem para isso. Dizia alguém, com prioridade, que os telejornais e as telenovelas são os hambúrgueres do espírito e as revistas os donuts da imaginação. Cada vez é mais verdade. Uns pela informação doentia e outros pela informação viciante.

Embora se queira escamotear a situação e dar outras justificações para tudo, o problema central de toda esta panóplia calamitosa está na família e na escola. A verdade é que qualquer pai responsável sabe que os seus filhos ficarão doentes se comerem só doces e chocolates! Engordarão imenso se comerem só hambúrguers. É pois urgente que se informem sobre o que não se deve comer, ou sobre o que não se deve fazer. A sociedade é um palco enorme e complexo, tão mais complexo pela diversidade e quantidade de pessoas que nele contracenam. Então não se entende como é que tantos educadores aceitem que a dieta mental das crianças seja composta por desenhos animados, videojogos e telenovelas para não falar do uso excessivo do telemóvel. Com uma alimentação intelectual tão carregada de adrenalina, romance, violência e emoção, como é que os jovens vão conseguir uma vida saudável e equilibrada?

Quando nas escolas se mencionam disciplinas curriculares como Educação para a Cidadania, leva-nos a equacionar o porquê de querer transmitir aos jovens como comportarem-se na sociedade, quando ao lado, mesmo os pais, lhes deixam espaço para a controvérsia comportamental.

A informação que se transmite tem que ser racionada, no bom sentido, no sentido positivo da realidade. Ora os jornalistas alimentam-se quase só de detritos de escândalos e de restos mortais das realizações humanas. A imprensa não informa, seduz, agride e manipula. Só a parte morta e apodrecida da realidade, chega aos jornais ou são por eles transmitidas. O importante, o cerne das questões, não interessa. Todos sabem que J.F. Kennedy foi assassinado, mas não sabem quem foi ele; todos sabem que a capela Sistina tem um teto lindíssimo, mas não sabem para que é que ele serve; todos acham que Saddam Hussein foi mau e que Mandela era bom, mas nem desconfiam porquê; todos ouviram falar de Pitágoras e do seu célebre Teorema, mas ignoram o que é um cateto. Ou seja, as realizações do espírito humano estão em decadência. Perdem importância.

De tudo isto resulta o quê? É simples. A família é contestada, a tradição é esquecida, a cultura banalizou-se, o folclore entrou em queda e a arte é fútil e paradoxal. Em contraponto, floresce a pornografia, a imitação e o egoísmo. O âmago de todas as questões, não interessa. O que importa é a superficialidade das coisas. Interessa o quê e não o porquê. É quase uma falsidade compulsiva o que nos chega todos os dias, quer como informação, quer como saber.

É tudo uma questão de obesidade. E não é física. É mental.

O homem moderno está adiposo no raciocínio, nos gostos e nos sentimentos. O mundo precisa de uma dieta mental urgente.


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