Henrique Ferreira
Os autarcas de TMAD e a regionalização.
3. As dificuldades da regionalização
A primeira a que se deve responder quando se fala de regionalizar um país é saber se ela é possível. Saber se a regionalização é possível ou não é fundamental para sabermos se devemos ou não reivindicá-la. Procuremos então uma resposta.
A investigação empírica sobre os processos decisórios das administrações centralizadas tem evidenciado os seguintes maiores problemas para os países não regionalizados:
- excessiva demora na tomada de decisão devido à morosidade dos processos de informação dos dossiês, devido à penumbra em que são colocados os conflitos entre interesses, com decisões opacas que transferem os interesses das regiões e sub-regiões para a Administração Central;
- excessiva presença do interesse nacional percebido por quem decide face ao interesse regional percebido e sentido por quem é objecto da decisão;
- sentimento de abandono da população das regiões por não poderem participar na decisão.
Estes três problemas militam a favor da regionalização mas não são suficientes para justificar a regionalização. Há outras duas áreas em que é necessário pensar para regionalizar. São elas: 1) a do conhecimento e da tecnologia; 2) e a do PIB e do poder de compra da região.
Hoje, existem, em todas as antigas oito províncias, instituições universitárias, politécnicas e de saúde para assegurar a produção do conhecimento e da tecnologia. Resta saber se a segunda condição, PIB e poder de compra da região, é já satisfatória em todas as regiões para garantir homogeneidade económica no interior das regiões assim consideradas (as antigas oito províncias). Neste caso, nenhuma das antigas províncias do Interior reúne condições para uma autonomia política e de recursos e uma associação litoral/interior na regionalização seria nefasta para as regiões do Interior mantendo o status quo actual. Ou seja, se a associação litoral/interior seria nefasta, a constituição com base num PIB/Poder de Compra baixos, embora homogéneos, não garantiria sustentabilidade económico-financeira à região. Exigir-se-á um PIB/Poder de Compra de pelo menos 25.000 euros por pessoa e ano.
Tal não será razão para constituir cinco regiões horizontais, correspondentes às CCDR`s, mas para apostar fortemente na descentralização económica e industrial para as regiões do Interior. Foi assim que fizeram a Alemanha, a Itália, a França e a Espanha ainda que em períodos históricos diferentes. A preparação da regionalização desses países foi feita com base em governos centrais que quiseram garantir igualdade de oportunidades de desenvolvimento a todas as regiões (Alemanha) ou a quase todas (França) ou que quiseram calar conflitos políticos e tensões regionais (Itália e Espanha).
Quando se procedeu à regionalização, o que não foi necessário na Alemanha porque, aqui, o processo é multisecular, já havia regiões com força económica garantedora de autonomia política e financeira. Pelo contrário, foi um erro regionalizar aquelas regiões em que não havia sustentabilidade económico-financeira porque, para elas, pouco benefício resultou da regionalização.
Finalmente, e feitos os dois considerandos acima, há que saber que natureza de regionalização se precisa. Tenho emitido a opinião de que o único modelo de regionalização válido é o criado para as regiões autónomas da Madeira e dos Açores. Qualquer outro modelo será andar a brincar às regionalizações, designadamente o modelo previsto na Constituição da República, que transforma as autarquias municipais em autarquias territorialmente mais extensas sem lhes dar nem conteúdo político nem conteúdo financeiro nem conteúdo de gestão da administração pública regional. Ora, com excepção das forças de segurança, da justiça, da defesa e da educação, toda a administração pública deve ser coordenada pelas regiões.
Assim, para regionalizar, é necessário começar por alterar a Constituição em conformidade com o modelo desejado de regionalização.
Depois, há que saber se o Estado é capaz de, em 10 anos, multiplicar por 1,5 a sua despesa com o pessoal da administração pública pois, numa fase de transição, não seria possível, pura e simplesmente, mandar os funcionários de Lisboa, Porto e Coimbra para a província. Há ainda que saber se o Estado pode gastar 1.000 milhões de euros em estruturas regionais para garantir capacidade de trabalho ao pessoal colocado.
Depois ainda, é necessário saber com que dinheiros seriam dotadas as novas regiões. Os das actuais CCDR`s de pouco lhes serviriam e os das autarquias municipais e de freguesia geravam uma nova «Maria da Fonte» se lhes fossem retirados para os dar às regiões que, a seguir, os redistribuiriam. Havia de ser o bom e o bonito.
Como se vê, regionalizar é difícil e complicado e, por Decreto, só pode gerar confusão.
Próximo número: 4. Modelos de regionalização
Bragança, 11 de Julho de 2019
Henrique Costa Ferreira