Manuel Igreja
Os rebuçados da Régua
Há coisas que de tão simples serem ou pelo menos assim parecem num primeiro relance, frequentemente nos levam a tender se não para o menosprezar, nos levam a olhá-las de fugida remendo-as para a prateleira das coisas sem importância.
A páginas tantas, consciente ou inconscientemente pecamos mesmo por delas nos desviarmos como se não estivessem à altura da nossa importância ou da nossa galhardia, porque sobranceiros medimos o mundo pelo tamanho da nossa pequenez tantas vezes tida como grandeza.
Vivemos num tempo de espuma convencidos que só o que reluz é que vale a pena não medindo nem o tempo nem a abrangência do fogacho, tendo para nós que determinaram onda é maior que a maré não vendo que nem ao areal ela chega.
São ilusões nestes dias de vendilhões. No entanto, se nos ativermos um pouco nos ensinamentos da vida, num repente concluiremos que é da e nas coisas simples que está o segredo da plenitude e a essência daquilo que vindo de ontem nos pode hoje permitir o melhorar do amanhã.
Muito mais quando essas coisas são doces, que é para irmos então que é tempo à ligação com o título por onde fizeram o favor de passear o olhar no começo deste escrito. Os rebuçados da Régua. Nem mais. Uma memória, um símbolo sem fronteiras e uma sensação de doçura real e imaginária de fazer crescer água na boca.
Ia dizer ou escrever, que são de fazer chorar por mais, porque prontos, enfim, todos sabemos que se o doce nunca amargou, também em demasia não é coisa que se recomende por via da saúde, algo a cuidar, pois, é mais que certo que é um bem preciso e isto de se estar vivo mais dia menos dia acaba mal.
Não que os rebuçados da Régua façam qualquer mal. Só são doces. Muito doces e saborosos. Claro que se vossemecê for daqueles ou daquelas que se podem apelidar como lambareiros, não leve a peito o que escrevi, que é para não se me vir depois queixar.
Mas se não conhece, prove. Experimente e depois diga se estou certo ou se estou errado quantos àqueles torrões amarelos a fugir para o laranja embrulhados primorosamente que nem onças de tabaco. A escrita está-me a fugir para o vício, mas são coisas. Para tudo há lugar na vida, como dizia o meu avô que era mestre no viver. Recato e moderação é que importa.
Garanto que não estou com sermão encomendado, nem pretendo vender produtos de perlimpimpim. Mas o tal ensinamento que nos diz que as coisas simples fazem a diferença e suportam o que conta, leva-me a chamar para aqui os rebuçados da Régua.
Embrulhadinhos ali naquele papel mesmo a pedir para serem destapados e degustados, são um dos maiores símbolos da identidade reguense. Só aqui existem, só por aqui se ouve o clamor a anunciá-los, e só por aqui se sabe o modo como são feitos.
A coisa é de tal monta, que ande uma pessoa por onde andar neste país de Deus, mal diz que é da Régua, logo se depara com uma referência aos ditos por parte de interlocutores de olhar saudoso e guloso. Da Régua? Pois, onde há aqueles rebuçados. A encomenda e a promessa do levar de um saquito são coisa de um abrir e fechar de olhos. O resto, são trocos.
E as rebuçadeiras com o seu ar lampeiro e gaiato a aproveitar cada visitante como oportunidade de negócio? Querem melhor exemplo de como se fazer bem? Querem melhor tradução simbólica da identidade reguense? Não estou a ver.
Olhem vejo é ali ao lado um rebuçado. Acho que não resisto. É da Régua, algo simples e sublime. Como a vida.