Luis Guerra

Luis Guerra

Património e energia

Em crónica anterior, referi-me aos elementos que conformam a riqueza da região transmontana, centrando-os na população e no território, e dando exemplos de algumas das suas potencialidades, sem esgotar, contudo, o assunto.

Com efeito, como é evidente, quando se fala da população não se está a mencionar apenas os indivíduos humanos que a compõem, mas também a incluir toda a sua atividade social, nomeadamente no domínio cultural, bem como a sua acumulação temporal.

Assim, de entre os ativos regionais, é necessário mencionar o património histórico, tanto material como imaterial, bem como a criação artística contemporânea, muitas vezes afastada dos circuitos comerciais mais conhecidos.

Nesse sentido, a preservação, valorização e difusão do património histórico, mas também dos agentes culturais locais, deve ser uma prioridade para os poderes públicos, quer enquanto veículo de afirmação de uma identidade regional quer como motor de desenvolvimento económico, considerando, nomeadamente, a diversidade de interesses que move hoje o turismo.

É inegável que muito tem sido feito pelo Poder Local no sentido da requalificação dos seus núcleos urbanos, preservando e valorizando, na medida do possível, os seus centros históricos. Mas subsistem algumas “ilhas” de abandono e degradação, onde menos se espera.

Assim, por exemplo, passeando pelas ruas do burgo medieval de Mirandela, fui surpreendido pelo número de edifícios arruinados, considerando que os respetivos arruamentos estão cuidados e que a cidade tem um grau de desenvolvimento apreciável, sendo das que mais tem resistido ao processo de desertificação do nordeste transmontano.

É certo que se trata, muito provavelmente, de edifícios particulares, mas o cuidado com o património edificado e a qualidade do espaço público podia justificar outro tipo de intervenção, nomeadamente sob a forma de parcerias inovadoras ou com os instrumentos legais disponíveis para a realização de obras de conservação coercivas.

Na verdade, o desenvolvimento urbanístico não contende com a preservação do património edificado, nomeadamente o dos centros históricos, devendo ambos ser harmonizados em prol da qualidade de vida da população e da imagem das cidades.

Por outro lado, falando de território, as suas potencialidades não se esgotam na agricultura e pecuária ou, mesmo, na silvicultura e mineração, visto que a produção de energias renováveis e o ecoturismo estão na ordem do dia.

Ora, não escapa a ninguém que a região transmontana é já um polo importante de produção de energia hídrica e eólica, pelo menos.

Contudo, essa fonte de riqueza nacional não se traduz proporcionalmente em investimentos reprodutivos na região, seja como contrapartidas da exploração dos equipamentos de produção elétrica por parte das suas operadoras seja sob a forma de afetação de receita fiscal.

Esses investimentos poderiam ser a forma de compensar os impactos ambientais que a construção ou instalação desses equipamentos sempre acarretam, nomeadamente ao nível dos ecossistemas, sendo, por isso, um fator de justiça e equidade.

No entanto, avançar nesse sentido implica, provavelmente, o aprofundamento do processo de descentralização, com o reforço de poderes e de legitimidade democrática das regiões nacionais, neste caso da Região Norte, e a convergência das comunidades intermunicipais que a integram, designadamente a Comunidade Intermunicipal das Terras de Trás-os-Montes e a Comunidade Intermunicipal do Alto Tâmega, a que se poderia juntar a Comunidade Intermunicipal do Douro relativamente aos municípios da margem norte deste rio, em torno dessa reivindicação e de outros projetos com escala regional.

Na verdade, a intencionalidade dos atores locais e regionais no sentido de desenhar um projeto de desenvolvimento humano e social sustentável, a médio e longo prazo, é uma condição imprescindível, mas não suficiente, para o pôr em marcha, sendo também necessária a solidariedade nacional em relação às regiões periféricas e essa tem que se traduzir em gestos concretos que promovam a igualdade de oportunidades para todos.

 

Luís Filipe Guerra, juiz e membro do Centro Mundial de Estudos Humanistas

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