Luis Ferreira
Pau para toda a colher
Quando nos referimos a tempo de crise, falamos sempre de situações aflitivas quer económicas como sociais. Ao longo da História, já podemos contabilizar muitas crises e algumas delas, demasiado graves e que se espalharam pelo mundo inteiro. A que mais recentemente vivemos, apanhou-nos de surpresa e levou a Europa a repensar a sua posição no mundo moderno em termos económicos e, equacionar a sua dependência, essencialmente face aos EUA, até porque foi lá que ela surgiu e rapidamente se espalhou pelo mundo inteiro. Resta saber se foi intencional ou não. Há quem afirme que foi propositada e bem estudada.
Seja qual for a resposta, é certo que a Europa foi apanhada desprevenida e todos os países viveram desde 2008 situações terríveis que levaram os diferentes governos a tomar decisões drásticas em termos económicos. Austeridade era e foi o mote de toda a governação. Portugal não foi exceção. Durante anos os governos eleitos levaram ao extremo a austeridade e com ela arrastaram a sociedade para extremos nunca vividos. Era necessário dinheiro para pagar a crise e por isso foi preciso arranjá-lo. Lembramo-nos que o FMI, mas não só, logo emprestou o que precisávamos, mas como era insuficiente, exigiu que o governo cortasse, sem dó nem piedade, nos salários, nas carreiras dos funcionários, nas reformas, nas pensões e impedisse a progressão de funcionários públicos. Foi o fim do mundo! Uma revolta silenciosa invadiu os lares portugueses ao verem-se despojados de parte dos seus salários ou das pensões e muitos ficarem desempregados quando as fábricas ou empresas onde trabalhavam fecharam.
Perante tanto desnorte, previa-se que a solução passasse por tomadas de posição restritivas, especialmente onde o governo tinha acesso direto. Claro que os funcionários foram os primeiros a serem expropriados do seu dinheiro. Era preciso pagar a crise e alguém tinha de o fazer. Não bastou subir os impostos e cortar salários e pensões. Tinham que travar a possibilidade de progredir nas carreiras para que não se gastasse mais dinheiro do Estado. Os Orçamentos foram espremidos e os vários ministérios viram-se em palpos de aranha para sobreviver nas teias da crise. Tudo foi controlado ao pormenor.
Agora que vamos saindo da crise e, de algum modo, vamos sentindo algum alívio em termos económicos nacionais, o governo já anuncia mudanças previsíveis para todos os portugueses, já concedidas no orçamento que vai ser aprovado. Mas não nos iludamos. Se algumas mudanças mais acentuadas se vão sentir, vão dever-se aos partidos que com o PS formam a geringonça, pois eles é que obrigam a que elas sejam uma realidade a curto prazo.
De todas as medidas em apresentadas, se umas foram bem recebidas, outras foram contestadas e ainda estão a ser objeto de discussão entre os partidos da coligação e os atingidos. É o caso dos professores. Vimos esta semana uma enorme greve nacional de milhares de professores que juntou as duas sindicais e fez repensar o governo quanto ao posicionamento dos professores nas carreiras que estão congeladas desde 2005. Alguém tinha que pagar a crise!
O governo já tinha dito que iria proceder ao descongelamento das carreiras, mas ninguém sabia exatamente como seria feito e o ministro da educação também não adiantou nada de concreto a esse respeito. Face à exigência dos sindicatos, o governo lá se abriu um pouco, o suficiente para se perceber que o tal descongelamento de carreiras não contaria com o tempo de serviço prestado ao longo de mais de 9 anos. Isto foi o suficiente para alertar os professores e os sindicatos para a possibilidade de uma greve nacional se o mesmo tempo não fosse contado e se as carreiras a descongelar não tivessem um limite temporário curto de execução. Com uma ameaça de greve por um lado e uma negociação difícil por outro, o governo teve de ceder em alguns pontos, mas a greve foi uma realidade e teve o condão de alterar muita coisa e adiar outras, mas também de manter a possibilidade de outra greve se nada mais for conseguido.
Não é despiciendo dizer que os professores pagaram uma parte considerável da crise. Pagaram efetivamente. A carreira que estagnou durante 12 anos e o que deixaram de receber durante todo esse tempo representaram muitos milhões para o cofre do Estado. Agora, no mínimo, o que o governo deve fazer é repor alguma justiça em toda esta injustiça. Os professores não podem continuar a ser pau para toda a colher. São sempre eles a pagar as crises! Quando não há dinheiro, corta-se no orçamento da Educação e lá estão os professores a apanhar por tabela. Isto tem de acabar.
É tempo de repor a justiça e contar todo o tempo de serviço prestado para poder progredir na carreira. Não contar esse tempo é simplesmente roubar. É crime e o crime deve ser sancionado, mas o Estado nunca é julgado nem condenado. Talvez seja por isso que os governos e alguns governantes fazem o que lhes apetece, inclusive servirem-se de dinheiros públicos que possivelmente chegariam para pagar aos professores o que se lhes deve. Basta. Penso que os professores irão ter a sorte do seu lado devido à proximidade de eleições e também porque os partidos da geringonça exigem e querem tirar frutos deste seu pressing. Pode ser que sim!