Alexandre Parafita
Que entidade infernal inspira esta gente?
O meu avô morreu quando estava a sachar um talhão de cebolo. Ao fim da tarde de mais um dia de luta com a terra, a mesma com quem viveu uma paixão fatal, torturada em anos infindos, sentou-se na beirada do geio, e ali se ficou, com a sachola ao seu lado. Ali o fomos encontrar, sereno, conformado com a sua derrota nesse combate desigual, inglório, com a terra. Como quem entrega, resignado, o seu último reduto a quem o escravizou a vida inteira.
Trabalhou, por isso, até ao último dia, até ao último minuto, até ao último instante da sua vida. Mas sempre achei que se tratou de uma situação absolutamente excecional. Até porque este Homem era também excecional.
Mas não. Ao ler hoje no Público (pág. 19, referenciando a última legislação do governo) que «(…) um trabalhador que peça a reforma antecipada com 60 anos e 40 de descontos terá um corte permanente na pensão de 49%», fico com a nítida sensação de que este governo é pior ainda que aquela madrasta terra que sugou até às entranhas os últimos instantes de energia do meu avô. Um governo mais inumano que humano, e que, por isso, só pode estar a ser inspirado por uma qualquer entidade infernal.