Manuel Igreja
Quem quer casar com a Carochinha?
O mundo é muito injusto. Não há direito. Anda a pobre da carochinha a pôr-se à janela a perguntar: - Quem quer casar com a carochinha que é arranjada e muito bonitinha? Quem quer? E nada!
Quer dizer, não será bem assim. Apareceu, segundo se diz, o João Ratão, mas esse não valeu. Morreu afogado no caldeirão, guloso, ainda antes de haver oportunidade de se ter desfeito a cama nupcial. Nem provaram.
Posto isto, continua a carochinha a suspirar por noivo que lhe alente as frias noites e lhe chegue mais que não seja um chá em hora de enxaqueca ou algo que o valha, pois isto de se estar vivo, também acarreta algumas necessidades.
Não bastasse isto, para aumentar motivos do lamento à suspirosa dama, um supor, agora aprecem para aí anúncios de oportunidades de ocasiões para se encontrar tampa para cada panela, de se topar quase ao calhas noivos para noivas a quem falta aquele certo cruzamento de olhares muito
breves, mas que dizem muita coisa por entre o silêncio das almas que se tocam.
Nas televisões em horário de entretenimento em quotidianos de muito aborrecimento, apregoam-se e exibem-se protagonistas à cata de uns minutos de fama e de uma eternidade com amores a emergir, rosas a florir, e sorrisos a despontar porque se encontrou o pé que serve no chinelo aqui sob a forma de sapato fino ou de bota de biqueira pontiaguda.
No ar anda agora a saga do quem quer casar com um agricultor, e/ou quem quer casar com o meu filho? E lá vão elas lampeiras, as serigaitas em busca da oportunidade de finalmente haver boda com gasosa a serviu de espumante, mas com trajes a condizer com a função que é de ocasião. Parece que elas se põem em bicos de pés e eles sobranceiramente optam.
Nem sei para que tanto trabalho. Nos meus tempos de menino e moço, na venda na minha aldeia havia um jogo de sorte que adaptado dava para isso. Numa folha de cartolina estavam uns quadradinhos que se furavam. A cada furo correspondia um prémio, assim tipo um doce, uma bola, um boneco, e um não sei mais o que. Ainda deve haver por aí jogos desse género.
Tenho para mim que ainda se pode aproveitar a ideia. Por exemplo, numa romaria ou num outro evento em que se queira amealhar uns trocos, colocam-se as oferecidas por detrás de um cortinado. Os moços chegam, agarram no prego e furam. Depois é só ver qual das lambisgóias calhou na rifa, e segue a rusga que se faz tarde na animação do povo que se não quer aborrecido nem desanimado.
Mas nisso de casamento antecedido com a pergunta de quem quer casar comigo, mestre, é o nosso primeiro. No momento da disputa dos resultados e de se repartir o quinhão, não ficou com a maior parte, mas perguntou quem o queria como companheiro a ver se dava, e deu. Logo apareceram dois pretendentes e casaram, sendo que aqui é um modo de se dizer que formaram governo.
Não faltou quem alvitrasse que era sol de pouco dura, mas durou. O enlace desengonçado e assente em estacas, aguentou-se. O homem é mestre. Ainda agora e para o futuro mais imediato não lhe falta quem se lhe queira juntar na necessidade de aliança que se adivinha. Tudo indica que ele irá continuar com a mão na maquina e todos querem ir no carrossel.
A pobrezinha da carochinha é que continua a bradar por noivo. Pode ser que o nosso primeiro lhe passe à janela e a queria. Não seria mau e seria de toda a justiça, já que histórias dela é o que mais nos contam.