Manuel Igreja

Manuel Igreja

Rapinanço

Dirá o meu amigo ou amiga se calhar que o termo utilizado no título que encima a escrita que se começa a desenhar é demasiado forte, assim ao ponto de chamar a atenção mesmo do mais desatento.

Reconheço que é, pelo que lhe desculpo o facto de rotular ainda sem ler ou saber o que se vai desenrolar texto abaixo, mas o bico da caneta fugiu-me para ele e eu não o parei. Deixei-o rabiscar e traçar a palavra. Às vezes dá-lhe para isso e ganha autonomia.

O que vale é que por muito independente que se julgue, acaba sempre por expressar o que me sai de cá de dentro, umas vezes directamente do coração sem ir ao cérebro, outras indo a ambas as partes do corpo como se recomenda. Uma e outra complementam-se ainda que frequentemente andem de costas voltadas. Infelizmente.

Voltando ao rego, como se diz na nossa terra, que é para ele não se desviar de novo. Peço neste ponto a vossas senhorias, que volvam o olhar por cima e para trás das três últimas décadas da vida em Portugal, feliz e merecidamente democrático, e digam se não concluem que foi um fartar vilanagem.

No meu ponto de vista, sucedeu que para aí uns trezentos concidadãos nossos, assim a olho, entre si rodopiaram nas cadeiras do poder político, financeiro e afins, e deitaram mãos a montões de notas de conto de rei, agora euro, deixando os cofres completamente vazios mesmo que não escancarados.

Muitos cheios de si próprios andaram por aí a acumular e a exibir riquezas e competências. Foram adulados, consagrados, medalhados, até que foram apanhados. Claro que todos se afirmam mais inocentes que menino de coro, e mais pobres que Jó. Quanto às riquezas fundiárias ou em património, escapuliram-se.

Entretanto, os bancos quase tiveram que correr o ferrolho e colocar a tabuleta de encerado. Mas como eram demasiado grandes para falir por causa das consequências em cascata, o Estado deu socorro e injectou nos moribundos milhões e mais milhões de euros ao jeito de quem alimenta a soro pessoa que definha a olhos vistos e tem a morte à espreita.

Ora sucede que sendo o Estado todos nós, e vivendo ele com o dinheiro dos nossos impostos, é mais que óbvio que as notas só não saíram do nosso bolso porque nunca lá chegaram e entrar. Nem as vimos, e tanta falta nos fazem, pois, uma pessoa bem sabe como as aplicar em proveitos bem melhores.

Mas pior que isso. Por causa do governar-se de uns poucos, desgovernou-se o país que no ano da graça de dois mil e dezanove, não tem dinheiro para aplicar na Saúde, na Educação, na Justiça, na Prevenção, e em tudo o resto que é uma competência e um merecimento de uma nação justa, equilibrada e democrática.

Resta-nos muito pouca vergonha e a decência anda pelas ruas da amargura, num país em que conta mais o que o árbitro rouba, do que o que alguns magarefes pimpões surripiaram durante longos anos. Muito mais que cem dias.


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