Ana Soares
Regionalização com seriedade e clareza
Que o sistema político português está em descrédito, por mais que os partidos o tentem negar, é algo indiscutível. Basta ver a abstenção nas eleições, o discurso que se ouve nas ruas ou a (não) renovação de práticas. Não sou das que criticam a política e os partidos por si só, até porque todos nós fazemos parte do sistema político. A verdade é que muitos também se limitam a criticar sem nada fazer para alterar. E é esta alteração que se exige. A “mensagem recebida” que alguns partidos disseram ter percebido nas últimas eleições europeias e cujas consequências ainda se aguardam… Algo me diz que o discurso se repetirá já nas próximas eleições.
A regionalização parece estar de volta aos palcos da discussão pública. Aqui há uns meses, na sessão comemorativa do 25 de Abril da Assembleia Municipal de Bragança, todos os partidos representados nesta assembleia apresentaram a regionalização como algo imperativo para o desenvolvimento da nossa região e uma oportunidade para um Portugal com mais e melhor progresso. Todos os partidos à excepção do CDS que, tal como tem acontecido na região, não se fez representar na dita sessão solene…
No referendo de 1998 a regionalização foi chumbada. Ainda que não vinculativo devido à abstenção, a verdade é que o “não” à regionalização ganhou com 61% de votos. Muitos esperaram que a descentralização se concretizasse por outras vias, outros eram simplesmente contra, outros deixaram-se levar pelo “partidarismo” que se impôs, muito acima do que realmente deveria ter estado – como devia acontecer agora – no centro do debate: o modelo de regionalização.
Discutir a regionalização tem que ser mais do que a repetição de chavões como “o poder mais próximo dos cidadãos é mais eficiente”, “Portugal vai para além de Lisboa” ou “É altura de concretizarmos as potencialidades de todas as regiões de Portugal”. Se todos estes princípios são a mais pura das verdades, não é menos verdade que não discutir em que competências, com que dotação orçamental, em que organismos, com base em que regiões e com que poderes será concretizada a regionalização, não passa de uma discussão sem qualquer interesse prático. Pelo contrário, pode até parecer – e parece muitas vezes – que só se estão a discutir posicionamentos para os novos cargos políticos que surgirão com a regionalização. O que não só é péssimo para o nosso regime como deitará por terra todos os proveitosos que podem advir da regionalização. Haverá certamente novos cargos e gente para os preencher não faltará e é tudo natural e até de salutar, desde que quem para lá vá saiba o que vá fazer e tenha um projecto que vá para além de determinada filiação partidária.
Não há que ter medo das palavras: no meu ponto de vista, uma região administrativa é a solução. Uma região bem desenhada, onde possa haver efectivamente um programa de desenvolvimento da região e, sobretudo, meios (técnicos, humanos e financeiros) para o concretizar. Autonomia com comprometimentos, responsáveis eleitos pela população que fossem efectivamente responsabilizáveis pelo trabalho que realizassem e formas de sustentabilidade e desenvolvimento regional sem descurar a coesão nacional.
A regionalização não é certamente uma receita milagrosa para o problema que todos sentimos: um Portugal a muitos ritmos, um Portugal a muitas velocidades. Mas depois de 20 anos em que os ditos modelos alternativos não se mostraram eficientes, urge encontrar uma solução efectiva. Uma solução que o seja de verdade, com um modelo que responda às necessidades dos cidadãos e não de quem parasita o sistema político. Esta não é uma decisão para uma ou duas legislaturas e por isso mesmo os políticos sérios e com propostas políticas (e não politiqueiras) devem assumir o debate, que se reclama profundo e sério, onde todos os actores que ganharam palco nos últimos anos (como os comunidades intermunicipais) sejam efectivamente ouvidas e os benefícios e exigências conhecidos. Porque, mais que potencialidades para uma verdadeira regionalização, não faltam na nossa região