Luis Ferreira
Sem fim à vista
Com o Verão à vista e a praia à espera de muita gente, seria normal esquecermo-nos da guerra que assola a Europa e cujas consequências se vão espalhando rapidamente a todos os continentes.
Já era tempo de acabar de falar da guerra, mas nada se consegue sobrepor a tão horrível episódio.
Se Putin pensava que em sete dias dobrava a Ucrânia e prendia Zelensky, enganou-se e do mesmo modo também nós nos enganámos ao pensar que a guerra não durava tanto tempo. Durou, dura e vai durar e ao que parece Putin não está muito preocupado com esse aspeto.
A única coisa que o incomoda é o facto de o ocidente não aceitar a sua supremacia militar e continuar a alimentar o exército ucraniano, fazendo prolongar o inevitável. Como isso é algo que não se resolve por vontade própria de um dia para o outro, resolveu mandar julgar alguns soldados do lado ucraniano, presos em combate e condená-los à morte como modo de pressionar o ocidente e conseguir troca de soldados ou, levantamento de sanções.
Depois dos dois cidadãos britânicos e um marroquino terem recebido como castigo por combaterem ao lado do exército ucraniano uma condenação à morte, está já agendado um novo julgamento, também de um combatente estrangeiro, desta vez sul-coreano. E não se pense que isto foi obra do acaso. Não foi. Os dois cidadãos britânicos servem bem o seu propósito pois é um golpe em Boris que tem ajudado com tudo o que pode o Exército ucraniano neste combate desigual e o sul-coreano é só lembrar que a Coreia do Sul é aliada dos EUA e, por este meio, atinge Biden. Pior é que o caso vai ser ouvido na “república” popular de Donetsk, um território separatista controlado por forças russas e pró-russas e que apenas é reconhecido como Estado pela própria Rússia, ou seja, legalmente e internacionalmente, não existe já que continua a fazer parte integrante da Ucrânia. Por crimes de lutar como simples soldados ao lado da Ucrânia, os britânicos Aiden Aslin e Shaun Pinner e o marroquino Brahim Saadoun foram condenados à morte num julgamento que durou apenas cinco dias. Simplesmente absurdo.
As Convenções de Genebra para os prisioneiros de guerra dizem que os combatentes não podem ser julgados por ter participado no conflito a ser julgado. O que fazer então? Como é evidente, a Grã-Bretanha já disse que iria fazer tudo para reverter a sentença dada, mas não será fácil convencer a Rússia de Putin a ceder, mesmo sendo em território que não lhe pertence, mas onde pensa que é dono e senhor. Será?
Zelensky pode até abdicar da entrada na NATO, mas a sua entrada na União Europeia é coisa assente e vai rolando cada vez mais depressa. Com esse objetivo, reuniu-se mais uma vez com a presidente da Comissão Europeia em Kiev e voltou a frisar que é possível vencer a Rússia e que está muito mais em jogo nesta guerra do que apenas o futuro da Ucrânia. As forças russas tentam ainda capturar Sievierodonetsk, a leste, até agora uma das batalhas mais sangrentas no conflito de quatro meses. A verdade é que o Donbass está quase perdido. Facto a discutir é para quem vai ser o território. Será que a Rússia pretende apoderar-se dele? Não creio, até porque terá de o reconstruir já que destruiu todas as cidades e pouca gente lá tem. Para que serve? Só tampão? E se for para os pró-russos, onde têm dinheiro para a reconstrução? Vivem de quê? As fábricas estão destruídas, os prédios caíram com os bombardeamentos, os campos estão abandonados e os serviços não funcionam. Como vão fazer? A quem interessa a terra queimada? A par disto, os cereais continuam fechados em armazéns e sem solução de exportação enquanto meio mundo espera por eles e passa fome raiando uma crise alimentar sem precedentes. É triste como se pode ir tão longe! Isto é um verdadeiro crime de guerra.
Para que nada fique esquecido, Volodymyr Zelensky, anunciou que Kiev pretende elaborar um "Livro dos Torturadores" com as informações recolhidas sobre os "crimes de guerra" que terão sido cometidos pela Rússia durante a invasão do país. O "novo livro" vai incluir "dados específicos sobre pessoas em concreto e que são culpadas por crimes violentos contra ucranianos". Zelensky disse ainda que o documento vai ser "um dos fundamentos da responsabilidade não só dos perpetradores diretos de crimes de guerra, soldados do Exército de ocupação, mas também dos comandantes". A intenção é boa, mas o resultado não altera nada porque nenhum dos responsáveis vai ser condenado efetivamente. Fica escrito no livro, mas será mais uma página da História, sobre as mais absurdas guerras da História.
Entretanto a guerra continua e continuam a destruição, as mortes, as incertezas, a fome e tudo sem um fim à vista.