Teresa A. Ferreira

Teresa A. Ferreira

Sonho de Natal

O Natal é tempo de família, tempo de alegria e confraternização, tempo de aconchego à lareira onde saltam histórias de antigamente, ainda que sejam as mesmas todos os anos, mas o interesse e o sorriso com que as ouvimos permanecem. Quantas vezes escutei ao meu pai as suas histórias de moço… E à minha mãe também.

Todos os Natais, eu e o meu mano, íamos passá-los com os meus pais a Paris. Apanhávamos o autocarro, junto ao tanque em Mirandela, e só saíamos no destino. Mas certo ano a neve, nos Pirenéus, resolveu fazer das suas. O trânsito circulava com dificuldades e ainda não havia autoestradas, estou-vos a falar do ano de 1975. O meu pai, achando que poderia ser perigoso viajar de autocarro, resolveu que o melhor era eu e o mano passarmos o Natal em Mirandela. Foi muito duro não ter o carinho e o colo dos meus pais. Cedo aprendi a passar esta época sozinha.

Como era muito miúda, teria 8 ou 9 anos, sonhei com o Natal à minha maneira. Vou contar-vos:

Os meus pais, muito felizes, apanharam um avião até ao Porto. Aí, meteram-se no comboio que os trouxe até Mirandela. Foram procurar-nos e na maior alegria abraçámo-nos e beijámo-nos tentando apaziguar as saudades que sentíamos. As lagrimas banhavam-nos o rosto. Fomos num carro de praça até Torre de Dona Chama, onde era a nossa casa. A imensa alegria de todos, fez-nos esquecer que não tínhamos nada para comer. Acordada do torpor em que se encontrava, a minha mãe, telefonou ao Ti Zé Mouco a pedir tudo quanto era preciso.

Fui para junto dela oferecer-lhe os meus préstimos, aliás, todos ajudaram. O mano foi num instante ao cabanal buscar um feixe de lenha miúda para acender o lume da lareira. Enquanto isso, a minha mãe tratava das rabanadas que iria fritar numa frigideira sobre as brasas. Eu ia-lhe chegando tudo quanto ela precisava. O meu pai, sentado num banco, ia mordiscando um pedaço de pão com queijo – esperava por melhor hora, pois era o provador de serviço.

Tudo se fez na maior das alegrias. Havia arroz-doce, aletria, sonhos, rabanadas, pasteis de bacalhau, polvo frito, e uma travessa de bacalhau com couves, batatas e rabas – essas não podiam faltar.

Fomos para a mesa consoar com o maior dos apetites. No final, sentámo-nos à volta da lareira a escutar os meus pais que, à vez, contavam histórias. Assistimos à missa do galo pela televisão. Depois, pusemos os nossos sapatinhos na lareira e fomos para a cama.

Na manhã seguinte, acordei bem cedo para ir ver o que o Menino Jesus me tinha deixado. Foi uma boneca linda, aquela com que andava a sonhar há muito tempo. O meu mano também foi ver. Teve um carro muito bonito.

Nisto, acordei do sonho e dei-me conta da realidade - dura realidade. Escondi a cabeça debaixo dos cobertores de lã de ovelha e chorei por muito tempo.

Hoje, olhando para trás, digo-vos: o Natal só tem graça se for passado com quem mais amamos. Não interessa o que há para pôr na mesa, nem os presentes, o que é verdadeiramente importante é estar presente de corpo e alma.

Se não for pedir-vos muito: nestas festividades, desliguem os telemóveis e convivam. Aproveitem enquanto ainda têm família ao vosso lado.

©Teresa do Amparo Ferreira, 21-12-2024



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