Manuel Igreja
Um Guarda-Chuva no Momento Certo
Neste nosso tempo de muita ciência e supostamente de muita sapiência, passámos a vida a complicar e a não enxergar o que frequentemente está bem debaixo dos nossos olhos. Não há decisão tomada ou tomar no que se refere a âmbito mais alargado que não seja logo objecto de estudos e planos quantas vezes pagos e bem pagos para contento de uns poucos a quem complicar muito interessa.
Note-se por exemplo no que se passou com o Alto Douro Vinhateiro, património da humanidade, desde que começou a ser moda e região referida como de enorme potencial de desenvolvimento. Boas intenções, juras de toda a atenção, planos estratégicos e coisas que tais, a serem todos colocados sobrepostos, davam caminho bem capaz de chegar daqui até à lua, onde se vê o tal homem com um molho de lenha às costas como castigo por ter trabalhado do Domingo. Dizem.
No entanto, o sabido, é que de pouco adiantaram. Quando se mencionava o rio Douro, a sua navegabilidade e os barcos que lhe sulcam as águas carregados de turistas, mais parecia que iríamos criar por estas bandas o El Dourado da nossa contemporaneidade. Iludimo-nos então e ficamos à espera que não chova para não se estragar o passeio dos visitantes. Ingenuamente, sem mais, tivemos para nós que a riqueza nos bateria à porta saltando das algibeiras dos que aqui aportam, para as dos que por aqui vivem.
Grosso modo, cruzamos os braços, esperamos, e criticamos quem se não preocupa connosco e não faz os passeantes deambularem por aí até que topem com algo que nos apeteça vender-lhes. Zurzimos em quem não coloca em letra de lei paragem obrigatória na nossa porta aberta para servir e vender. Só não arranjámos ainda maneira de aproveitar bem as oportunidades de negócio, disponibilizando na hora certa e no sítio certo, o produto imediatamente mais necessário ou apetecido, porque se soube despertar o desejo de se provar, de se ter e de se levar.
Porque é que me lembrei disto e agora aqui o coloco? Eu digo. Há dias, andava nas minhas voltas junto ao rio e tive de parar por causa de uns pingos de chuva em dia de Verão. Abriguei-me a contragosto debaixo de uma árvore perto dos barcos ancorados na Régua. Gente a subir para eles, e gente a deles descer, foi coisa de umas largas centenas em pouco tempo, algo que nem nos admira, como sabemos.
Admirado e se calhar não devia, fiquei eu com uma coisa. Mal o chão se respingou, num ápice, o local encheu-se de vendedores ambulantes de guarda-chuvas. Gente humilde e de condição que ninguém quer, mas de sentido de negócio apurado por um saber passado de geração em geração, cuja atitude de todo em todo nos pode servir de exemplo.
Tenho a certeza de que se ao S. Pedro desse na real gana de destapar as nuvens para nos enviar raios de sol daí a pouco, num abrir e fechar de olhos, se viriam chapéus e bonés em venda para se protegerem as cabeças da torreira que por aqui não é de brincadeira, muito mais para quem vem de terras com muito menos horas de céu azul.
Ainda gostava de perguntar aos exímios comerciantes ali em presença, em que fontes se abasteceram de tanta eficácia. Deve ter sido na universidade da vida, digo eu, naquela em que se ensina que na maioria das vezes com as coisas simples se conseguem as coisas mais importantes. Basta não complicar e seguir em frente agindo para que se não fique à espera do que tarda.
Os nossos dias não vão fáceis. Mas se calhar com um pouco mais de atenção e de união, as coisas podem começar a descomplicar-se. Não sei. Já agora: Quer um guarda-chuva? E um ramo de flores?