Manuel Igreja

Manuel Igreja

Um Mundo às Arrecuas

John Keynes, um dos mais influentes economistas de todos os tempos, olhando o mundo em que se estava nos anos trinta do século passado, e esforçando-se por ver o mundo que então parecia desenhar-se, afirmou que um dos maiores problemas da geração dos seus netos, grosso modo a nossa, seria a maneira como se iria lidar com o muito tempo livre ao dispor. Juntando as pontas e o modo de raciocinar, Keynes assentou esta sua referência no facto de saber que havendo máquinas a elaborar o trabalho com um enorme acrescento de valor, uma vez que se produziria muito mais em muito menos tempo e com muitos menos custos, logo passava a haver condições para todos trabalharem menos horas sem qualquer prejuízo e com incontornáveis benefícios. A riqueza mais facilmente multiplicada graças à inteligência humana, somente tinha de ser mais equilibradamente repartida entre quem colocava o capital ao dispor e quem vendia a força e o saber do trabalho. Nessa visão, ninguém ficava a perder já que quem tinha de rentabilizar investimentos os veria crescer, e quem tinha de trabalhar, trabalharia menos porque todos trabalhavam. Para garantir o equilíbrio a maquinaria faria a sua parte. Sabemos no entanto hoje em dia que falharam as previsões do douto senhor que na época dos nossos avós, viu muito para lá de até onde a vista alcança. Acontece que Keynes viu bem, analisou bem, mas perspetivou com erro. Esqueceu-se que a natureza humana frequentemente impede o bom senso quando a inteligência é toldada por certos sentimentos entre os quais a avareza, um dos tais sete pecados mortais que nos levam a caminho do inferno segundo o catecismo. Falharam, não porque em termos de análise meramente económica estivessem erradas, mas antes porque não se contou na equação com a ganância desmedida que é apanágio do capitalismo selvagem. Basta vermos este nosso tempo em que atingido que foi o mais elevado estádio de bem-estar social desde sempre graças às dinâmicas do dito, caminhamos às arrecuas a olhos vistos para uma situação em tudo igual aos dias em que se vendia muita força por pouco dinheiro. Parece impossível mas é verdade. Quando a humanidade tem tudo para viver mais e melhor, começa a viver mais, mas pior, com mais desassossego e com mais injustiça unicamente porque o fruto da sua ciência alimenta uns poucos, um punhado, quando deveria sustentar muitos e muitos. Mas pior, vivemos um tempo em que o que vamos deixar a quem nos segue geracionalmente é pior do que o que recebemos das mãos dos que nos antecederam. Querem um exemplo? Um amplo estudo divulgado pelo Fórum Económico Mundial, o tal que se reúne anualmente em Davos na Suíça, estima que com a chamada 4ª. Revolução Industrial se vá perder sete milhões de empregos. Nem mais. Quase apetece dizer que seria cómico se não fosse trágico. Sendo pequenos deuses sem que tenhamos aprendido a ser homens, graças à nossa inteligência e a mais o que com ela desenvolvemos, neste presente que é o nosso, não estamos a conseguir fazer pela primeira vez que o futuro seja melhor do que o passado, apesar de tudo haver para que a vida possa ser um pouco melhor à face da Terra para tudo e para todos. Mas não. Vai ser pior porque o desgoverno é completo. Não há quem mande e coloque regras. O mundo anda ao “deus dará” entregue a mafarricos. Não sei, mas que isto ainda vai acabar mal, lá isso vai. Pode ser que o vento ainda espalhe o juízo por aí afora e finalmente com ou sem sonho se comece a fazer o mundo andar para a frente que para trás mija a burra.


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