Chrys Chrystello

Chrys Chrystello

Vamos falar de educação

Crónica 261. vamos falar de educação, 5 junho 4.2019

Declaração de interesses: só uma vez na vida fui professor de jovens, por imposição do serviço militar em Timor quando ministrei durante três meses o antigo ciclo preparatório do liceu (5º e 6º ano de escolaridade) na montanha em Bobonaro (setº a dezº 1973).  Voluntariamente ministrei Inglês, depois, durante o 2º período (1974) no Liceu Dr Francisco Machado em Díli, usando os métodos de Paulo Freire (muito avançados naquela época) mas ao fim desses três meses decidi que não tinha mesmo vocação para ensinar. Mais tarde, na Austrália dei aulas de Tradutologia e preparei na UTS (Universidade de Tecnologia de Sydney) os alunos candidatos à profissão de tradutor e intérprete sob a supervisão da NAATI, entidade federal de acreditação oficial

é responsabilidade do Estado formar as pessoas para que saibam ser melhor profissionais e capazes de gerir mais autonomia” José António Salcedo 3.6.19

aí estamos de acordo e daí o tema do nosso colóquio 2020...pois o estado não o faz, só pensa em falsificar estatísticas, os resultados escolares dos açores são dos piores na Europa, e em poupar $$ sem contratar profes mantendo vínculo precário 10, 15 anos e mais.... e a geração mais antiga, dedicada (não serão muitos, mas há bons profes) está neste momento desgastada, exausta, desmotivada e frustrada ...fazem tudo menos ensinar e são quase que obrigados a passar toda a gente para baixar as taxas de retenção… Chrys

«interessa-me a educação pois ainda me preocupo com o mundo. Se queremos mudar o mundo, temos de investir na educação. A economia e a guerra não posso mudar pois estão nas mãos dos donos disto tudo, mas a consciência humana ainda pode ser mudada. Por isso me interesso pela educação. É possível mudar a consciência dos mais jovens. Mas temos de mudar de paradigma, a educação tem de ser valorizada com gente com talento e competência, com a vocação pedagógica, de transmitir valores (...)» Chrys 2006

Desde que vim da Austrália para Portugal, há duas décadas, continuei a cada três anos, a ter de comprovar as minhas atividades de formação pessoal e profissional para continuar acreditado como tradutor oficial. Aqui já vi professores sem vontade nem vocação porque não podiam ser mais nada e ficaram enfastiados a dar aulas, sem que o sistema fizesse a triagem entre os bons profissionais e os maus, sem que algo fosse feito para recuperar os que podiam ser bons professores, dedicados, interessados e capazes de aceitarem qualquer desafio de passar conhecimentos e ensinar a pensar. 

Vi a educação e o ensino serem degradados pela tutela e pela sociedade, com a família a dissolver-se e a endossar as suas obrigações parentais para os educadores. A escola passou a ser um armazém para onde se mandam as crianças enquanto se vai ganhar algum e os professores que os eduquem…

Quando há uma greve a preocupação dos pais não é sobre um dia a menos na missão de aprendizagem, mas um dia a mais sem ter onde deixar os filhos. A educação assistiu impávida ao massacre desses párias da sociedade, os professores, e por isso o orçamento nacional baixou mais de 4% na secundária e básica e mais de 8% na terciária (2011). Os professores qualquer dia passam a acampar na escola para fazerem o que os pais não fazem e deixarem de ser uns malandros, pois eram os únicos privilegiados, no resto da função pública ninguém se lhes iguala.

O ensino que temos é uma lástima, mas, propositadamente, escolhem-se os professores para bodes expiatórios da crise, e se bem que muitos mereçam ser punidos, a maioria come por tabela. Em vez de se extirparem os culpados, aplicam-se as novas medidas draconianas para os incumpridores e para os outros, os que se esforçam e cumprem, mesmo sem ambiente de trabalho apropriado, sem condições físicas ou materiais para exercerem a sua profissão, e receberem de prémio a honra de serem vilipendiados como prémio da sua dedicação. Os professores escolhidos para bode expiatório com carreiras congeladas. Os alunos, sem sequer estudarem, passam para não estragarem as estatísticas em Bruxelas.

 

Defendo a meritocracia que vivi na Austrália, que premeia os resultados e os esforços (mesmo que seja fora da caixa = outside the box) em vez de termos umas avaliações de professores, tipo faz-de-conta, que ninguém quer e para nada servem. Lamento, mas nem todos nasceram para ensinar….

Também, ao contrário do que vem sendo anunciado desde 1974, nem todos nasceram para aprender. Nesta fase de rápida mudança, assistimos a um ensino que se assemelha ao do século XIX, mas sem os castigos corporais, as orelhas de burro, as palmatoadas, etc. Assiste-se a um total desrespeito pela Escola e pelos professores, quer por alunos, por pais e pela sociedade em geral. De ano para ano assiste-se a um menor rendimento e preparação dos alunos, e creio que tal se deve ao desaparecimento da velha guarda de professores primários da Escola do Magistério. 

Depois, há a necessidade e a obrigatoriedade de passar os alunos, custe o que custar. Recentemente, surgem, cada vez mais, casos de alunos com necessidades especiais que servem para justificar a integração nos quadros de pessoal docente com curtos cursos de “necessidades especiais”. Os professores são tradicionalmente avessos à mudança, não se cultivam nem têm formação capaz (e a culpa nem é só deles), gostam de engrenar a sua rotina de ensinar e repetem modelos exaustos. Desde 1975 repetem-se as reformas atrás de reformas, mal dando tempo a aferir sobre os seus resultados…

Por outro lado, cada vez têm menos tempo para ensinar e preparar aulas, gastam enormidades de tempo em reuniões improfícuas sobre tudo e mais alguma coisa além das constantes alterações da tutela. Os alunos de meios desfavorecidos (rurais ou urbanos) não têm ao seu alcance alternativas de ensino, andam contrariados, desmotivados e muitas vezes não querem mesmo aprender, o futuro deles são as vacas e não a sala de aulas…. O resto direi noutra altura…

Entretanto como os miúdos não gostam de Filosofia, Matemática e outras coisas sem relevância, o melhor a fazer é cortar essas disciplinas e seu peso curricular. Os editores agradecem, pois sempre são mais uns livritos a imprimir para os encarregados de educação comprarem.

Depois, há uns anos, uns iluminados em eduquês, sentados nos seus gabinetes com comodidades e equipamentos adequados, em vez de porem as crianças a gostar da língua e da gramática inventaram a TLEBS, coisa muito fina, própria de doutores, esquecendo-se que a TLEBS é boa para os filólogos e estudantes do ensino superior que se dedicam àquela área específica da língua. Esqueceram-se, porém, de que iria sempre haver uma certa dificuldade porque no ensino do Francês, Inglês e doutras línguas não se podem ensinar aqueles palavrões. Nós plebeus da educação estávamos conscientes  do logro, pois essas línguas de bárbaros incultos se descuidaram ao não adotarem a TLEBS. A França e a Inglaterra (como todos sabem) são países de analfabetos que não percebem nada de linguística e ninguém lhes disse que Portugal inventara a TLEBS. 

Para o Diário dos Açores (desde 2018), Diário de Trás-os-Montes (desde 2005) e Tribuna das Ilhas (desde 2019)

Chrys Chrystello, Jornalista, Membro Honorário Vitalício nº 297713 [MEEA/AJA, Australian Journalists' Association] CP AU3804


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