Nuno Magalhães
White Power!!
Agora que consegui chamar a sua atenção, deixe-me dizer que não, não sou um racista de extrema-direita (ou extrema-esquerda, pois não nos podemos esquecer dos crimes hediondos cometidos por regimes comunistas) a debitar alarvidades num artigo de opinião. Não, não acredito na supremacia da raça branca (ou caucasiana) sobre qualquer outra. Não, não acredito em superioridade de qualquer raça em detrimento de outras.
Consciente da natural desilusão de todos aqueles que abriram o link ou que iniciaram a leitura deste texto com o objetivo de me insultar, “rebentar-me” os argumentos ou, de teclado em punho, fazer justiça, nas redes sociais contra um racista, xenófobo de extrema direita, digo-vos que nem tudo está perdido. Aproveitando o sensacionalismo de um título que vos chamou à atenção, permitam-me convidar-vos a ler, concordar ou discordar, a serem livres dos estigmas que martirizam a nossa sociedade e convidar-vos a utilizar toda essa raiva reprimida para criar pontes.
Nem só de crítica, de ódio e textos longos e cabulosos vive o Homem – ou pelo menos assim acredito que deveria ser. No entanto, a atualidade parece querer provar-me o contrário. E as provas são várias, basta abrirmos qualquer rede social para compreendermos que a maioria dos feeds que lemos escorrem ódio, julgamento e crítica a algo ou alguém. Sejam personagens ou partido políticos, sejam clubes de futebol, sejam movimentos civis, ninguém passa impune ao crivo dos diversos “eruditos” que tudo descobrem e tudo veem. Qual olho da Providência, de Osíris, de Odin ou ____________ (preencher a gosto com a sua figura mitológica, divindade ou sociedade secreta preferida), nada escapa ao julgamento quase instantâneo destes verdadeiros “Illuminati” do Facebook ou Maçons do Twitter. Ninguém fica impune, nenhum gesto fica por descodificar, ninguém está a salvo destes descobridores de segredos, de significados ocultos e de mensagens subliminares. Verdadeiros Indiana Jones abrindo uma Caixa de Pandora das “teorias da conspiração”.
Não sou, certamente, “mais papista que o Papa” ou ingénuo para acreditar na pureza de todos os seres humanos, a História do Mundo assim nos demonstra o quanto somos imperfeitos e o quão violenta tem sido a nossa caminhada civilizacional. Contudo, desculpem-me, mas recuso-me a ser parte de uma nova sociedade que primeiro apedreja, julga e ataca, e nunca para para refletir sobre a realidade das coisas. Vivemos tempos em que nos sentamos em frente aos nossos computadores sempre preparados para atacar, criticar e procurar significados profundos em ações e palavras, mesmo que eles não existam. Vivemos tempos em que o Smartphone se tornou a mais poderosa arma, capaz de destruir a vida de alguém, capaz de desvalorizar os movimentos mais simbólicos e justos que existem, capaz de colar os mais vis estereótipos ao gesto mais simples que possa existir. Contra toda a lógica, o ser humano, um verdadeiro “animal social”, utiliza as suas capacidades para destruir tudo o que se encontra em seu redor, que utiliza a sua sociabilidade para depreciar e oprimir tudo e todos, que se preocupa mais em ser um “vigilante” ou “justiceiro” da verdade e dos bons costumes, do que praticar os valores que apregoa defender – tais como a tolerância, a liberdade, a sociabilidade.
Vivemos cada vez mais da destruição do próximo, do julgamento apressado e das “caças às bruxas” que se perpetuam pelas apps que temos ao nosso dispor. Seguimos cegamente estes reis das palavras, como se vivêssemos “Vicariously” [1] através deles, focando toda a nossa energia, conhecimento e atenção na destruição, no desfazer, no dividir.
E após isto tudo, após gastarmos toda a nossa energia, todos os cantos do nosso ser no ódio, na destruição e na separação, o que resta de nós para nos dedicarmos a construir?
Se aplicássemos tanta dedicação em construir, em unir, em criar pontos de encontro, tal como empregamos na crítica, na procura desgovernada de mais um facto ou ação que nos permita brilhar mais que os nossos monitores e ecrãs, talvez não existissem mães a abandonar bebés em ecopontos, não teríamos polícias na rua a lutar por mais justiça, talvez não tivéssemos situações de racismo, xenofobia ou violência.
“Mãos que não dais, o que esperais?”, a sabedoria popular sempre é boa conselheira (com as obvias exceções), e se não estamos dispostos a ser os construtores dessa sociedade livre, tolerante e progressistas que todos desejamos, como podemos exigir que outros o sejam? Estará sempre nas nossas mãos denunciar, corrigir e, até, criticar, mas também está nas nossas mãos unir, construir, criar. Talvez nada tenhamos aprendido com os milhares de anos da história da Humanidade, mas eu pretendo continuar a dedicar-me a tentar construir pontes do que a erguer muros. E você, que história quer construir?
[1] Vicariously / Vicarious – viver experiências imaginárias através dos sentimentos e/ou ações dos outros