No dia 17 de fevereiro foi feita em Podence a apresentação do Museu dos Caretos de Trás-os-Montes ao Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que o apadrinhou e prometeu vir novamente à aldeia ver as obras.

Essa apresentação decorreu no adro da Casa do Careto e contou com a presença do arquiteto convidado, Joaquim Portela que fez uma breve explicação do que se pretendia com a obra e das caraterísticas essenciais que presidiram na elaboração do projeto.

Logo ali o Diário de Trás-os-Montes entendeu que ser útil divulgar também por todos os transmontanos uma ante-visão desta obra tão desejada pelos Caretos.

Estabelecido o contacto só hoje se concretizou a entrevista com o Arquiteto Joaquim Portela que aqui reproduzimos.



Entrevista com Joaquim Portela, arquiteto do futuro Museu dos Caretos de Trás-os-Montes

DTM (António Pereira) – Perante expectativas tão elevadas qual foi a motivação que teve para “desenhar” este projeto e de onde veio a inspiração?

JP (Joaquim Portela) – A inspiração… é difícil falar de inspiração! Quando fui ao local, o local em si já potência uma série de coisas: as vistas para o Azibo, o fácil acesso, o terreno em si… quase que cria ali um auditório natural, mas essencialmente as vistas para o Azibo são fantásticas. Uma pessoa que chegue ali, e não conheça o local, não precisa de mais inspiração do que a vista propriamente dita.

DTM – No fundo o espaço arquitetónico insere-se naquele meio, que é as vistas do Azibo…

JP – E tira proveito disso. Nós procuramos não criar ali um “pisa papeis”, criar uma infraestrutura que sirva, não só, quem visita, mas todos os locais. Que as pessoas possam usufruir do espaço, não só quando vistam o Museu, mas ao longo do ano. Que tenham ali um espaço onde possam ir ao café, levar os “miúdos” a brincar... É quase como um novo espaço público que se oferece às pessoas que visitam e às pessoas que habitam por ali.

DTM – Pode-se dizer que há uma certa “experiência” que se pode ter naquele espaço?

JP – Sim, acho que sim. Na realidade tiramos proveito da vista, o edifício arquitetonicamente é um edifício que tira proveito disso porque, na parte de exposição tem um grande óculo que está virado para o Azibo.

Aqui tenho de explicar o edifício: não quisemos criar uma barreira, quando entramos no edifício que está elevado, tem uma receção ao nível do R/C, mas depois a parte de exposição localiza-se no primeiro piso, e o auditório no piso -1. Ao nível do R/C só temos a loja e a cafetaria, portanto nós tentamos fazer um espaço púbico e tirar proveito disso mesmo. Numa hora fora do funcionamento do Museu, que a cafetaria possa funcionar e dar apoio a uma zona pública. Existem em vários museus pelo mundo fora este tipo de anfiteatro natural, e, portanto, tentamos tirar proveito tanto da topografia do terreno como da vista, e eu acho que o projeto consegue isso.

DTM – O Museu tem um espaço museológico, dedicado aos Caretos, e um espaço de usufruto de cafetaria e um auditório?

JP – Sim , tem um auditório com capacidade para 250 pessoas e uma zona de reserva de coleção no piso -1. Ao nível do R/C tem uma área para a loja e para a cafetaria, a loja está localizada no hall de entrada, a cafetaria já está um pouco deslocalizada do hall e também pode ser servida pelo exterior do Museu e fica virada para um espelho de água e com vista para o Azibo. Quando entramos no edifício, entramos por baixo, é quase como se estivéssemos uma zona de chegada realçada. Ao subir temos uma zona de exposição, uma parte de exposição temporária e outra de exposição permanente. De um lado viramos o edifício para esse espelho de água e do outro lado temos só um óculo que reforça a vista para o Azibo.

DTM – Pode levantar um pouco o véu sobre a parte museológica? no que concerne à parte dedicado aos Caretos e aos rituais de inverno da região.

JP – Os Caretos estão de várias formas. De uma forma estática, porque temos de ter uma representação estática das máscaras, dos fatos… e essa representação de alguma forma também deve ser física, porque as pessoas gostam de ver.

Este Museu não poderá ser só estático, porque seria completamente obsoleto. Parte do que nos estamos a expor também é uma história, e essa história tem que ser contada. Não é uma boa forma estar a ler num rótulo de uma máscara, não é propriamente a melhor forma de contar uma história. Atualmente existe uma serie de audiovisuais, de outros meios interativos, o que vai depender do que conseguirmos de orçamento adicional para a parte expositiva, porque um Museu pode custar 5€ e depois um filme pode custar dezenas de milhões, o que não será necessário, mas será preciso algum investimento para que esse conteúdo chegue às pessoas, para que os alunos das escolas possam visitar e interagir com o Museu, e para que entre num roteiro internacional de Museus.

DTM – Entramos numa fase da conversa em que interessa falar dessa parte cultural e de importância para a região, que para além de uma obra arquitetónica é uma mais valia para a região. Estes aspetos estão previstos?

JP – Sim. Nos procuramos transformar aquela área numa zona que possa recolher centenas de milhares de pessoas. Estou convencido que depois do Museu estar pronto as pessoas vão procurar visitar, o Museu a ganhar outras dimensões e com isso também a região.

DTM – O Museu do Careto funcionará como âncora ? É também essa intenção?

JP – É motivador, é uma alavanca. Tem de ser, porque senão todo o trabalho que estamos a fazer não é um bom trabalho. Tem de ser uma alavanca para região. Alias, qualquer iniciativa desse género, muito mais no interior, tem que ser muito bem feita. Nós temos e tivemos o cuidado neste projeto de não criar um “elefante branco”, de criarmos uma coisa que seja para alem de exequível, que depois ao nível da manutenção, tivemos todo esse cuidado de criar um Museu que funcione.

DTM – Muitas vezes as pessoas só visitam locais pela própria arquitetura, que também é um marco. Se o marco da arquitetura tiver aliado ao marco dos Caretos de Podence é um misto de vantagens.

JP – Nunca é essa a nossa intenção quando fazemos um projeto. Claro que ser acontecer ficamos contentes. A base é criar um Museu com a qualidade que é necessária para que catapulte os visitantes.

DTM – A arquitetura é uma arquitetura moderna e de assinatura. Pode-se dizer isto?

JP – Pode, embora não seja uma coisa que eu ache muito importante, a questão da assinatura. A arquitetura só é boa se na realidade servir o objetivo.

DTM – Falou num orçamento que ronda os 5 M€. Existe vontade política de apoiar este projeto? Sentiu essa vontade em todos os intervenientes?

JP – Sim, tenho sentido que as pessoas estão motivadas e que é uma coisa lógica. É preciso um espaço físico com a dignidade que a história e os Caretos merecem e eu acho que isso é uma coisa que qualquer pessoa da região se sente motivada a ajudar. Não é um Museu que não esteja ligado às pessoas, toda a gente sente que faz parte da história da região.

DTM – A região tem mais do que os Caretos de Podence. Há várias “rituais” diversificados e todos valiosíssimos na região. No Museu “cabem todas essas tradições"?

JP – Obviamente, não serve não só para a Podence como para outras áreas geográficas. Eu acho que o Museu não tem de ser estático. Pode ter uma exposição permanente de grande qualidade, mas deve ter outro tipo de exposições para que as pessoas não sintam que chega visitar uma vez. As pessoas têm de voltar e tem de participar na história do Museu. Podemos ir à América do Sul, podemos ir à África, podemos ir a outras zonas da Europa.

DTM – Há quanto tempo é que começou a elaborar este projeto?

JP – O projeto iniciou há cerca de um ano.

DTM – Acha que a obra do Museu poderá ser concluída em pouco tempo? Acha que em 5 anos o Museu estará concluído?

JP – Tem de estar em menos, em 2 anos tem de estar pronto.

DTM – Esse prazo é ser otimista?

JP – Não é ser otimista, nós temos reunido esforços para que isso seja possível. Portugal não é um país rico, não se pode dar ao luxo de andar 10 anos a discutir um projeto, não temos esses meios. O tempo é dinheiro.


O Museu dos Caretos "tem de ser uma alavanca para região"

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