A aldeia de Cicouro, no concelho de Miranda do Douro, retoma na sexta-feira a "Chocalhada", ritual para "espantar os maus espíritos" que esteve interrompido durante quase meio século e para cujas origens os investigadores procuram respostas.
"O ritual manteve-se ininterruptamente até ao início dos anos 60 do século passado. Contudo, a guerra colonial e imigração levaram muitos jovens para fora e o ritual acaba por desaparecer. Desde então, ter-se-á realizado uma ou duas vezes, sem, contudo, sabermos precisar datas exatas", referiu Alcides Meirinhos, investigador da Associação de Língua e Cultura Mirandesa (ACLM), que apoia a iniciativa.
Segundo a crença popular, esta tradição era uma forma de "espantar os maus espíritos", para que não exercessem as suas influências nefastas sobre si e os seus rebanhos.
"É um ritual que faz parte das festividades de Santo António (...). O Santo António de Cicouro, por se festejar no inverno, foi sempre o que teve mais devoção na aldeia. Era tido como santo protetor dos animais em tempos de maleitas ou doenças nos animais. Como não abundavam veterinários, as pessoas dedicavam os animais ao santo protetor", explicou o investigador.
Para o investigador, nascido na aldeia do Planalto Mirandês, muito se tem especulado sobre a origem da Chocalhadas de Cicouro, mas sem uma conclusão "unânime".
"Tudo começa na noite do dia 05, à noite, no final da última novena, a mocidade, trajando capas de honras, capotes tradicionais e outros agasalhos, munidos de chocalhos e outros objetos metálicos que imitem o som de sinos, davam volta à aldeia, sempre acompanhados de bombo e caixa. No final fazia-se a festa junto ao grande lume de cepos que ardia no terreiro", explicou, Alcides Meirinhos.
Apenas os rapazes que já tenham "pago a entrada", ou seja, todos aqueles que tinham passado pelos rituais de iniciação são aceites como "moços".
"Aos mais novos e as raparigas e mulheres é vedada participação em todo o percurso, eventualmente na rua onde moravam ou apenas enquanto as mães os avistassem", explicou.
Trata-se de uma tradição do Solstício de Inverno, onde o sagrado e o profano se confundem, e que as populações do Nordeste Transmontano "teimam" em preservar e manter a "pureza da tradição".