A Assembleia Municipal de Mirandela aprovou hoje uma recomendação às diferentes entidades intervenientes para reanalisarem os pareceres favoráveis à construção de um parque eólico na serra de Santa Comba, que guarda a maior concentração portuguesa de pinturas rupestres.
As pinturas foram descobertas na década de 1990 e há 14 anos teve início o processo para a instalação de um parque eólico na Serra que se estende pelos concelhos de Mirandela, no distrito de Bragança, e Valpaços, no distrito de Vila Real.
O processo do parque eólico começou em 2008 e o projeto obteve Declaração de Impacto Ambiental (DIA) condicionada há cinco anos.
Desde que foi anunciada a data de início de construção, prevista para setembro e entretanto adiada, que se gerou um movimento contra a instalação das torres na serra.
Foi de entre os contestatários que saiu o pedido que levou à realização de uma sessão extraordinária da Assembleia Municipal no dia de hoje, com o ponto único do parque eólico na agenda.
Os diferentes grupos parlamentares acordaram apresentar uma recomendação à Comissão de Coordenação de Desenvolvimento Regional do Norte (CCDR-N), à Direção Regional de Cultura do Norte (DRCN) e ao Ministério do Ambiente “no sentido de produzirem uma eventual reanálise aos seus pareceres “em função de novas informações sobre achados arqueológicos e patrimoniais”.
Diferentes intervenientes na sessão consideram que a DIA do parque eólico “está desatualizada”, na medida em que foi emitida com base em informação recolhida no período entre 2012 e 2014.
“Em 2014, a prospeção da totalidade da serra não estava feita, e ainda não está feita”, argumentou Joana Teixeira, arqueóloga que faz parte do movimento contra o parque eólico, que tem ganhado visibilidade nas redes sociais com a página “Juntos pela Serra de Passos sem Ventoinhas”.
Apesar de se falar de “novas descobertas”, a arqueóloga reconhece que entre “a grande fase dos anos 90 e os últimos anos, o trabalho de campo não foi muito, não houve propriamente projetos de investigação”.
Garante, contudo, que “quer em intervenções mais esporádicas, quer agora com os projetos que estão em curso”, como o EscarpArte para tornar as figuras visitáveis, “como era espectável o numero de sítios começou a aumentar, a dispersão espacial é maior, há novos painéis”.
“Nós podemos pensar só na área que ocupa o parque eólico, mas em termos patrimoniais aquela serra é uma unidade, não é o facto de a obra não ter um impacto direto sobre o sítio A, B ou C, é de facto o impacto que a obra tem sobre todo o conjunto”, argumentou.
A decisão sobre a compatibilidade do parque com as pinturas não será tomada pelo município, como esclareceu a presidente da Câmara de Mirandela, Júlia Rodrigues, que vincou que “se houver a proteção especial daqueles locais, obviamente (sobre) possíveis indemnizações que foram suscitadas não está em causa o município, mas sim a tutela”.
“O município vai responder afirmativamente a quem tutela estas condicionantes, se não houver condições e caducar a licença, interrompe-se o processo, quem paga é quem toma decisões”, afirmou.
A autarca sublinhou ainda que o município não tem condições para assumir o encargo financeiro da indemnização que teria que ser paga à empresa para parar o investimento de 30 milhões de euros, “sob pena de ficar comprometida toda a ação” municipal no futuro.
Júlia Rodrigues, que está à frente desta autarquia desde 2017, lembrou que “desde a década de 80 que o município apoia as investigações arqueológicas, investiu milhares de euros em investigação”.
“Que projeto de divulgação foi implementado pela comunidade científica?”, perguntou, afirmando que “foi necessário existir um investimento em energia renovável para que se interessassem pela serra a comunidade científica, do património e políticos locais”.
A serra de Santa Comba, que guarda a maior concentração portuguesa de pintura rupestre, encontra-se em processo de classificação como Sítio de Interesse Público (SIP).
O processo estará em discussão pública e contempla também a fixação de uma zona especial de proteção (ZEP), que impede, segundo a lei, qualquer intervenção "sem prévio parecer favorável da administração do património cultural competente".