A associação Último Recurso mostrou-se hoje disponível para avançar com uma grande ação de litigância climática em Covas do Barroso para travar a exploração mineira de lítio no concelho de Boticas.
“À semelhança daquilo que fizemos contra o Estado português, que foi processado no ano passado, estamos agora também a investigar se existirá, de facto, fundamento jurídico para colocar uma ação cujo objetivo será encerrar a mina e não permitir a exploração de lítio aqui na região”, afirmou Mariana Gomes, presidente e fundadora da organização não-governamental (ONG) .
Em Portugal, segundo a responsável, só existe uma ação de litigância climática que é, precisamente, a ação interposta contra o Estado português por esta associação, com o apoio das organizações ambientalistas Quercus e Sciaena, por “falhar na aplicação da Lei de Bases do Clima”.
Mariana Gomes falava aos jornalistas à margem do 9.º Encontro Nacional pela Justiça Climática, que decorre até domingo, em Boticas, distrito de Vila Real.
É neste concelho que a empresa Savannah quer explorar a mina do Barroso, que obteve uma Declaração de Impacte Ambiental (DIA) favorável condicionada, mas que é contestada por autarcas e população que se juntou na associação Unidos em Defesa de Covas do Barroso (UDCB).
“Eu diria que os fundamentos, inclusive, estão previstos na DIA que teve um parecer favorável. Pior do que isso é que o próprio Ministério Público (MP) já deu um parecer a dizer que a DIA deveria ter sido considerada desfavorável”, apontou Mariana Gomes.
Em fevereiro foi divulgado um parecer do MP, não vinculativo, que defende que a DIA da mina do Barroso “padece do vício de violação da lei” e “deve ser anulada”.
O MP foi notificado a pronunciar-se na sequência de uma ação judicial interposta pela Junta de Freguesia de Covas do Barroso, para anular a DIA, enviando um requerimento para o Tribunal Administrativo de Fiscal (TAF) de Mirandela onde corre o processo.
Mariana Gomes disse acreditar que, no caso deste projeto mineiro, os danos ambientais e sociais são superiores ao interesse público e considerou ainda haver uma “violação muito grande do direito à informação”.
Se avançar, a ação poderá ser administrativa ou civil, como foi a ação contra o Estado português.
Questionada sobre o que representa de novo uma ação de litigância climática, já que há outras ações judiciais em curso contra o projeto mineiro, respondeu que “trazer o fator clima permite exigir uma maior especialização dos juízes que vão decidir o caso”.
Exige também, acrescentou, a “assistência de técnicos que percebam não só de ambiente como de clima e, de certa forma, exige uma maior ponderação tendo presente a Lei de Bases do Clima que coloque obrigações e metas muito restritas ao Governo e às demais entidades”.
“O objetivo desta ação é a obtenção de um resultado climático, ou a mitigação, adaptação ou redução de um dano climático ou o pedido de metas mais ambiciosas a nível de clima e a própria ação tem que ter incorporações científicas”, frisou.
No terreno, segundo adiantou, a organização quer perceber o que já foi feito, o que falhou, qual a posição da população e começar a identificar quais seriam as testemunhas a levar a tribunal.
“De modo a ter uma representatividade jurídica e científica, mas também pessoal de alguém que está na linha da frente dos impactos desta mina”, concretizou.
O Encontro Nacional pela Justiça Climática acontece em Boticas para, segundo a organização, demonstrar solidariedade com a luta dos movimentos locais contra a mina a céu aberto.
“O objetivo é conseguir chamar para o movimento de justiça climática a temática da mineração, demonstrar a importância destas lutas pelo território e pela vida”, referiu Mariana Riquito da UDCB e da Rede Minas Não.
Já Aida Fernandes, residente em Covas do Barroso e também da UDCB, salientou que o encontro vai ajudar a “levar mais longe” a luta da população.
A organização junta três dezenas de entidades e para além das minas, foram ainda discutidos temas como os transportes públicos, ferrovia, minerações em mar e a transição energética.